Foto: Maria João Marques
“Habituei-me a olhar para aquele homem, invariavelmente de fato de macaco,
com outros olhos. Não conseguia ver nele apenas o artífice que trabalhava
naquela oficina. Pareceu-me adivinhar que por detrás daquele sorriso matreiro
se escondia uma constante procura da métrica certa, da palavra exacta… ao mesmo
tempo que as peças saíam, perfeitas, das suas habilidosas mãos.”
António
Cordeiro (Actor)
Conhecemos Mestre Romão Moita
Mariano ontem e penas temos de não o ter conhecido há muito mais tempo.
Privamos consigo, escutando seus poemas, estórias de outros tempos, relatos e
experiências vividos, por alguém que nos enleia facilmente na ternura do seu
olhar.
Palavras escutadas ditas por uma
alma genuinamente simples e imensamente rica.
Ao escutá-lo, vemos passar pelos
nossos olhos pessoas, gestos, crenças, alma.
Verdadeiramente representa o que (para
nós) é ser Alentejano.
Transcrevemos de seguida um poema
intitulado: Alentejo povo meu, para que também aqui, honra seja feita aquele
que tais versos proferiu.
Marco Valente
Alentejo Povo Meu
Alentejo, povo triste
que canta p’ra disfarçar
a mágoa que nele existe!
Canta, quando se embriaga,
E só pára de cantar,
Um dia, quando se apaga.
Alentejo, povo agreste
na epiderme curtida,
na roupa com que se veste!
Povo de fé e de esperança,
de fé com que é feita a vida,
de esperança que nunca alcança.
Alentejo, povo meu,
povo inculto, povo rude,
sem ser cristão nem ateu!
Povo escravo do que come,
e se há alguém com saúde,
é sempre quem passou fome.
Alentejo, povo ordeiro,
povo de brandos costumes,
tolerante, hospitaleiro.
Que parte o pão aos bocados,
para calar os queixumes
e a fome aos desgraçados.
Alentejo, a tua herança
são punhados de cantigas,
que eu canto desde criança.
Quem as escreveu e compôs?...
Foram muitas gerações
de poetas como nós.
[1990]
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