quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

A Luz da Caniceira ou da Carniceira


Desenho de Marta Valente
Este fenómeno conhecido como Luz da Caniceira ou da Carniceira ocorre, com tal designação, entre as seguintes povoações e/ou locais: Alcácer do Sal, Figueira dos Cavaleiros, Ferreira do Alentejo, S. Romão, Herdade da Palma, Estrada Nacional que vai de Alcácer do Sal a Santiago do Cacém, Grândola, Montes Velhos, Gasparões, Lagoa dos 3 Marcos ou 3 Naves, Monte de S. João, Ribeira da Abegoaria.
Várias são as versões da dita e múltiplos os avistamentos. Acrescentamos mais uma (inédita) em seguida:
Caso sucedido a José Pulquério, pessoa dos seus 40 anos, morador em Beja e natural dos Gasparões.
“Estava com uma namorada, no interior de um veículo ligeiro, ao pé de uma terra chamada Olhas, de noite, num caminho velho, debaixo de uma árvore.
De repente, do lado do pendura surgiu uma Luz fixa (parecia tipo de um candeeiro, um petromax, mas com uma Luz ainda mais forte).
Assustados, meteram o carro a trabalhar, arrancaram e a dita Luz ainda os acompanhou durante cerca de 3 ou 4 Km, do lado de fora do pendura, à altura do vidro da porta do veículo.
Iam das Olhas para Ferreira.
Ocorreram estes factos há cerca de 20 anos atrás, entre a Primavera e o Verão.”

Bibliografia pessoal e Links a consultar quanto a este fenómeno em específico:

VALENTE, Marco (2013) – A Luz da Caniceira – um conto popular alentejano, In Aldraba, Boletim da Aldraba – Associação do Espaço e Património Popular, n.º 13, Lisboa, pp. 16-20


sábado, 21 de setembro de 2013

Os "cabrões" dos Gasparões

Em primeiro lugar, queremos elucidar que o título não visa denegrir a imagem de ninguém, nem os actuais habitantes desta pacata localidade alentejana.
Apenas define um episódio sucedido por estas paragens e que ficou na memória das gentes mais idosas. E que urge recolher e dar à estampa – neste caso, “pôr a navegar” na net.
Alguns episódios jocosos, por assim dizer, sucedem no nosso Portugal contemporâneo.
Pelo Alentejo sucedia que, quando alguém queria edificar uma habitação (por exemplo) chamava os familiares e amigos da sua terra e de terras mais próximas. Um trazia a concertina, outro a sua viola campaniça e toca de fazer um baile, os célebres “bailes à casa”. De tanta folia e dança o terreno lá ia sendo nivelado para melhor erguer a edificação.
Há muitas dezenas de anos atrás, num monte nas proximidades dos Gasparões, as pessoas juntaram-se para um desses bailes à casa. A folia corria bem, até que, algumas moças vislumbraram ao longe dois indivíduos que eram conhecidos pelo seu mau feitio e desacatos que armavam constantemente. Algumas delas viraram-se para os restantes gritando:
“Fujam, que vêm aí os cabrões dos Gasparões !
Fujam, que vêm aí os cabrões dos Gasparões !”
E as pessoas correram a esconder-se num armazém que existia nas proximidades. Ao chegarem ao local, um dos indivíduos deitou a porta abaixo à patada, entrando ambos no recinto. O outro respondeu assim, aos gritos que ao longe ainda ouvira:
“Oh moças não fujam,
Oh moças não tenham medo!
São os cabrões dos Gasparões,
Que vêm visitar o putedo!”
E vai de distribuir pancadaria a uns e outros, a torto e a direito.
Esta estória, contou-a o Sr. Luís Diogo Barradas (Luís do Estanque), em 2011 com 81 anos e morador em Montes Velhos.
Sr. Luís Diogo Barradas ou Luís "do Estanque"
Também há alguns anos atrás escutamos a um idoso, que nas proximidades ou mesmo em Vilarinho das Furnas, teria sucedido um episódio igualmente revelador da veia poética do nosso povo, mesmo neste género de episódios.
A estória era mais ou menos a seguinte.
Uma moça, casada, teria andado “enrolada” com um rapaz (moço mais novo), e passado algum tempo aquele deixara-a. Sucede que, numa altura das festas na povoação (certamente relacionada com os rituais de fecundidade dos solos) a dita rapariga passou próxima ao rapaz, pois como seriam da mesma aldeia ou de povoações próximas uma da outra, tal teria inevitavelmente de suceder.
Naquele tempo, os rapazes usavam cornos de touro à cinta, pelos quais bebiam vinho (não existiam copos por aí além, como é usual nos nossos dias), e o rapaz tinha um desses cornos à cintura.
A moça, tentando deixá-lo mal visto aos olhos dos seus amigos atirou com o seguinte verso:
“Cantador que vem na estrada,
De onde vem? Para onde vai?
O corno que traz à cinta,
É seu ou de seu pai?”
O rapaz, moço habituado aos cantares ao desafio, não se acanhou, respondendo logo de seguida:
“O corno que trago à cinta,
Não é meu nem de meu pai!
É um cabelo do teu Homem
Que de maduro lhe cai!”.
Continuaremos assim, a recolher e a registar estes episódios, que para além dos seus aspectos espirituosos também revelam a veia poética e de improviso, tão cara ao nosso povo.

sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Paremia I

Publicarei também posts mais curtos, com alguns pensamentos, ditames, provérbios, (etc...) escutados aqui e ali, por onde a vida e o trabalho me levarem.
Aqui fica o primeiro:

"Pará-raios nas Igrejas,
fazem sorrir os Ateus.
Os Padres abraçam a Ciência,
porque duvidam de Deus."
informante, Sr. Manuel Ferreira, 56 anos, nado e criado em Évora

quarta-feira, 17 de julho de 2013

Ao Amigo e Humanista Luís Maçarico


As palavras cintilam                                                                                    
“Diante da música                                         
Do mar de Jerba                                             
Quais pérolas perdidas,                                                             
Frescas como o peixe                                  
Que vem na rede,                                         
As palavras cintilam                                                                                     
Na tarde de mar.”
Luís Maçarico, Jerba,                                                                                   
 14-10-2002

Estrelas de Verão
“Às vezes sinto o odor
E o veludo das mãos
A voz adormecida
As palavras húmidas os olhos
Onde dormitavam estrelas
De verão

Às vezes desejo essas carícias

Perdidas na poeira do tempo
Levadas talvez pelo vento
Para que mar
Ou deserto?”
Luís Maçarico, 05-2002

Porque as homenagens sentidas devem ocorrer em vida.
Foi no Sábado, dia 01 de Outubro de 2008, que o conheci, aquando da apresentação do Mestrado em Portugal Islâmico e o Mediterrâneo, em Mértola, no Campo Arqueológico. Quando o vi, pensei que iria ser um dos professores do Mestrado ou um dos oradores convidados. Logo nesse dia vislumbrei o grande ser humano que ali estava.
Logo no início do Mestrado, o Luís e eu efectuamos um primeiro trabalho apresentado em conjunto, através de uma análise de um artigo da arqueóloga Isabel Luzia. Demos o nosso melhor (apesar da distância que nos separava durante a preparação da dita, sempre navegando pelo mar da net, entre Lisboa e Beja), e julgo que estivemos bem, sim. Conforme, meu amigo bem o disse no seu blog “Águas do Sul”: «aprendemos um com o outro e ficamos bem na fotografia, pois toda a gente nos felicitou pela informação apresentada.»
Atraiu-me a atenção a patrimónios não raras vezes imperceptíveis: aldrabas, contrabando, mão de Fátima, só para citar alguns exemplos.
Escrevemos estas linhas, pois acreditamos firmemente naquelas palavras escutadas a um ancião em 2006, nas proximidades da Serra da Estrela: “Grande Homem, rapaz? Grande Homem é aquele que nos dá uma oportunidade!” As palavras não terão sido exactamente estas, mas o seu significado sim.
Esta singela homenagem da nossa parte, ocorre por múltiplos e variados motivos, que passamos a resumir:
  • 1.        O Luís foi a primeira pessoa, que sinceramente, achou que uma série de lendas e demais elementos patrimoniais que eu havia recolhido por estes espaços mais a Sul deveriam ser dadas à estampa;
  • 2.       É um verdadeiro amigo, na plenitude da palavra, amizade que iniciou o seu cultivo e caminhada em Outubro de 2008, durante a frequência do Mestrado em Portugal Islâmico e o Mediterrâneo;
  • 3.       É um Humanista Universal (poeta, antropólogo, associativista, escritor),e a sua obra retrata o melhor património de todos: as pessoas, seus sentimentos e complexidades.

Mas sem mais delongas, aqui deixamos o seu registo biográfico, mas há muito mais Luís para conhecer para além da sua escrita e recomendamos assim o seu trato e amizade. É algo que vale muito a pena almejar e conservar, pois é puro, verdadeiro, como tudo o mais na vida deveria de ser.

Natural de Évora, onde nasceu a 29 de Outubro de 1952.
Licenciado em 1994 pela Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Ciências Sociais e Humanas, em Antropologia, com: “Barbeiros de Alcântara – A Identidade Masculina e Bairrista entre Estratégias de Sobrevivência e Ameaças de Extinção.”
Completou em 2005, o Mestrado em Antropologia (Património e Identidades), no Instituto Superior das Ciências do Trabalho e da Empresa, com a tese subordinada ao tema: “Os processos de construção de um herói do imaginário popular – o Caso de Santa Camarão.”
Em 2012, completou o seu segundo Mestrado em Portugal Islâmico e o Mediterrâneo, com o seguinte tema de tese: “A Mão que Protege e a Mão que Chama: Orientalismo e Efabulação em Torno de um Objecto Simbólico do Mediterrâneo.”
Trabalha no Município de Lisboa. Nos tempos livres é associativista, tendo sido fundador de várias associações desde 1982 e dirigente de colectividades.

Alguns livros publicados:
2010 – Associativismo, Património e Cidadania, Confederação Portuguesa das Colectividades de Cultura, Recreio e Desporto / Grupo Dramático e Escolar “Os Combatentes” / Aldraba Associação do Espaço e Património Popular;
2009 – Aldrabas e Batentes de Porta: uma reflexão sobre o Património Imperceptível, Aldraba Associação do Espaço e Património Popular;
         - Jóias Imperceptíveis em Portas de Lisboa Aldrabas, Batentes e Puxadores nas Casas de Catorze Personalidades da Cultura Portuguesa, Apenas Livros
2005 – Memórias do Contrabando em Santana de Cambas um contributo para o seu estudo, Junta de Freguesia de Santana de Cambas

Escritor de inúmeros artigos, dos quais destacamos os seguintes:
2012 – A Importância dos Objectos para a leitura do passado, Arqueologia Medieval, n.º 12, Campo Arqueológico de Mértola, Afrontamento;
2007 – Os Heterónimos de um Mistério: Azóias, Cubas e Morábitos no Imaginário Popular. O caso de Montemor-o-Novo, Almansor, n.º 6, Câmara Municipal de Montemor-o-Novo;
2006 – Os Morábitos na Arquitectura Religiosa do Sul, Callípole, Câmara Municipal de Vila Viçosa;
2005 – Aldrabas e Batentes de Montemor-o-Novo: Um Olhar Antropológico, Almansor, n.º 4, 2ª série, Câmara Municipal de Montemor-o-Novo

Publicou 19 livros de poesia:
2013 – Ilha de Jasmim, Edição do Autor;
2012 – Geografia dos Afectos, Edição Apenas Livros;
          - Transumância das Pequenas Coisas, com o apoio da Câmara Municipal de Castro Verde;
2008 – Cadernos de Areia, Lisboa;
2006 – Ar Serrano, Edição Câmara Municipal do Fundão;
2004 – Caligrafia do Silêncio, Lisboa;
2001 – A Secreta Colina, Edição Câmara Municipal de Lisboa;
2000 – Lisboa, Pegadas de Luz, Edição Câmara Municipal de Lisboa;
1999 – A Celebração da Terra, Edição das Câmaras Municipais de Évora e Montemor-o-Novo, Junta de Freguesia de Nossa Senhora Da Vila e Delegação Regional de Cultura do Alentejo;
1998 – Os Peregrinos do Luar, Lisboa;
         - Lisboa, Cais das Palavras, Edição Câmara Municipal de Lisboa;
1997 – O Sabor da Cal, Edição da Câmara Municipal de Beja
         - Vagabundo da Luz, Edição Liga dos Amigos e Junta de Freguesia de Alpedrinha
1996 – Intim(a)Idade, Lisboa;
1995 – Os Pastores do Sol, Edição do Autor, versão trilingue (português, francês e árabe);
1994 – Lisboa, Asas de Água, Edição Câmara Municipal de Lisboa;
1993 – A Essência, Lisboa;
1992 – Mais Perto da Terra, Lisboa;
1991 – Da Água e do vento, Átrio.

Milhares de versos publicados, na comunicação social portuguesa e estrangeira. Através da sua veia poética, despertou-nos a nossa poesia (que carece ainda de muita mestria e dialéctica mais – e por certo carecerá para todo o sempre), que se encontrava adormecida devido aos trilhos por vezes esquecidos e outrora trilhados com muito mais ardor.
Diversos títulos publicados nas áreas dos contos e literatura infantil, estando representado em múltiplas antologias.

Nunca me esqueci também, de uma frase que escutei um belo dia durante as minhas deambulações/prospecções pelas serranias nortenhas e que era a seguinte:

“Há pessoas na vida,
Que passam e levam um pouco dos outros
Outras, passam e deixam um pouco de si.”

Bem haja amigo Luís por partilhares um pouco de ti comigo/connosco, do fundo do coração.

Texto: Marco Valente


Bibliografia consultada:
MAÇARICO, Luís (2013): Ilha de Jasmim
-------------------- (2012): Transumância das Pequena Coisas, apoio Câmara Municipal de Castro Verde;
-------------------- (2010): Associativismo, Património e Cidadania, Edição do Autor;
-------------------- (2008): Cadernos de Areia, Edição de Autor

domingo, 30 de junho de 2013

Aos cidadãos anónimos do Norte, Centro, Sul e Ilhas



Escrevo este post, uma vez que creio ser devida, a homenagem a todos aqueles que, dotados de uma riqueza imensa interior, são constrangidos a se auto-ostracizarem e menosprezar o seu valor intrínseco e inato, em muitos casos com os quais nos temos vindo a deparar de Norte a Sul do País.
Tal sucede talvez, por causa de um ambiente social actual que menospreza os mais avançados na idade, desvalorizando as suas experiências e os seus conhecimentos, em múltiplos sectores da nossa sociedade (o que explica também a actual situação de crise em que o país se encontra).
Como o afirmava o Prof. Cláudio Torres há algum tempo atrás[1], mais ou menos com as seguintes palavras: «Infelizmente a escola actual ensina que os mais velhos são burros e ignorantes, que os seus conhecimentos de nada valem. E que para evoluir, os jovens têm de imigrar para as grandes cidades, libertando-se assim desses ensinamentos.»
Ou ainda José Alberto Franco, amigo da ALDRABA[2], valorizando o trabalho e funções das colectividades por esse país fora: «Uma colectividade sem autoestima, em que os usos e costumes sejam vistos como “coisa de velhos sem instrução”, está nas mãos dos “média” e da oferta comercial.»[3]
Ora, totalmente de acordo com ambos, aliás, podemos observá-lo através da macrocefalia do litoral com relação ao interior do País e em múltiplos outros exemplos, que não vêm por ora ao caso.
É necessário criar as reais condições para que os mais jovens não sintam necessidade de emigrar, e ao invés de vergonha sintam orgulho nas suas tradições, conhecimentos empíricos e identidades, que são transmitidas de geração em geração.
Fica aqui como pequeno exemplo, uma curta pérola recolhida em Ferreira do Alentejo, escutada a um idoso que optou pelo anonimato (pela vergonha que verificamos sentir em dizer estas coisas e que no nosso entender não devia sofrer):

“O Rico e o Pobre são 2 pessoas
O Soldado defende os 2
O Contribuinte paga para os 3
O Trabalhador trabalha para os 4
O Vadio come dos 5
O Usurário vigariza os 6
O Advogado defende os 7
O Bêbado ri-se dos 8
O Confessor absolve os 9
O Médico mata os 10
O Cangalheiro enterra os 11
A Caixa de Previdência fica com a massa.”

Por aqui se poderá observar como este indivíduo, assim como outros demais, na casa dos setenta/oitenta anos de idade (e não só estes) por vezes e em certos casos percepcionam a sociedade que nos rodeia assim como alguns dos seus personagens. Retrata uma maneira popular, partilhada por muitos, de entender a realidade, e que também entendemos ser Património Imaterial.
Fica aqui esta pequena homenagem aos que guardam em si estórias, lendas, contos, rezas, mezinhas, folclore, religiosidade, saberes, tradições, adivinhas, jogos tradicionais, lengalengas, memórias, provérbios, esconjuros… eu sei lá que mais aspectos identitários possam ser enumerados e que procuraremos sempre recolher e dar à estampa o melhor que nos for possível.
Que existam sempre amigos e colegas para bem os coligir para que a memória e a identidade perdurem para o futuro.

Texto e foto: Marco Valente

Bibliografia consultada:
FRANCO, José Alberto (2008): A tradição e o progresso, In Aldraba, Boletim da Aldraba Associação do Espaço e Património Popular, Boletim n.º 5, Julho, Lisboa, pp. 2-3


[1] Fechando com chave de ouro uma justa homenagem em vida a quem como ele trabalha nestes espaços a Sul, contagiando com o seu sorriso e o seu imenso Amor, aqueles que com ele trabalham e se relacionam.
[2] Associação do Espaço e Património Popular. Constituída em 2005.
[3] FRANCO, José Alberto (2008): A tradição e o progresso, In Aldraba, Boletim da Aldraba Associação do Espaço e Património Popular, Boletim n.º 5, Julho, Lisboa, p. 2

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Ontem (Hoje e Amanhã) somos todos Gregos, Brasileiros, Turcos, Iranianos…

Há coisas que são Património Universal, que nos formaram enquanto cidadãos, enquanto seres humanos. Alguns dos valores que nos guiam (ou pelo menos no nosso humilde entender deveriam guiar) prendem-se com ideais que num dado momento foram apenas uma deia na cabeça de um iluminado que a quis levar ao Mundo, e a que muitos aderiram, pois pareceu-lhes ser a melhor de todas, mesmo que utópica.
As ideias geram sonhos e quando nos tiram os sonhos despojam-nos da nossa identidade.
Na Grécia, fecham-se emissoras nacionais, acaba-se, pasmem, com:
Orquestra Sinfónica Nacional, Orquestra de Música Contemporânea e o Coro da ERT.
Quando nos tiram a música, tentam tirar-nos os sonhos, mas jamais o conseguirão.


Enquanto isso, no Brasil, forças policiais à semelhança dos tempos de ditadura militar de Getúlio Vargas iniciam uma onda de violência (tentando culpar manifestantes pacíficos) atacando jornalistas, cidadãos (com o beneplácito de alguns fascistas que ilibariam assassinatos executados pelas forças policiais se necessário fosse em tribunais !!! – n.º 11 do seguinte link). Se isto não é uma Ditadura, então o que será ?


Enquanto isto, na Turquia, um outro ditadorzeco, manda esbirros atacar cidadãos que se opunham a uma decisão falsa e repleta de mentiras. As manifestações já ocorrem em várias cidades turcas. Há sistemas que caem de podres. O Turco (sem a ajuda externa americana) ruiria em poucos dias como um castelo de cartas. Claro está que não quereríamos que fosse substituído por um governo religioso extremista radical (para influência da religião sobre a política já nos bastou a Inquisição durante a Idade Média e o que sucede em vários países de diversos credos em todo o Mundo) – misturas que sempre resultaram na ditadura do mais forte.


Por tudo isso, do Irão sopram ventos de esperança e mudança, trazidos pela juventude, que derrotou os extremistas nas urnas e optou por um moderado (enfim, o ideal seria um estado laico, mas Roma e Pavia não se fizeram num dia).
Como diz o jornalista da TVI24 “Roxo é a cor da mudança. Contra todas as expectativas e logo à primeira volta.” Que seja mesmo a cor da mudança, para melhor, são os nossos sinceros votos.


sábado, 15 de junho de 2013

Aos Pastores (moirais e maiorais)

Aos Pastores (moirais e maiorais[1])

Toda a vida fui pastor
Toda a vida guardei gado
Até à morte por todos fui respeitado
Em minha última caminhada fui louvado

Pelos ásperos e ondulados xistos serranos
Em transumância cíclica e constante
Sornego[2], rugas formando com seus sulcos
Vestígios de um caminhar jamais errante

Trago na pele as marcas do meu viver
Nas mãos, músculos e ossos sinais do meu sofrer
Aos estranhos recebo com um sorriso
Após inicial receio e sobreaviso

Conheço cada pedra, árvore e recanto
Cada peco[3], ribeira e barranco
Searas, montes, montanhas, filhos e mães
Aldeias, gentes, lugares, bestas e cães

Para mim nunca nenhuma terra era estranha
Nem possuía referências obscuras
Desde as planícies douradas ou verdejantes
Às ásperas montanhas… vidas tão duras

As carraças que pelas minhas pernas sobem
Levam o sangue dado de bom grado
Pra proteger a integridade do rebanho
Qualquer sacrifício é suportado

Encostado a um qualquer malhão[4]
Suportando frio, vento, sol constante
Ou no meio do gado dormitante
Sempre atento a qualquer predador ou meliante

Guardo gado sim e disso tenho orgulho
Fui sendo toda a vida bom pastor
Sentinela deste Sul qual imenso trilho
A todos tratei com desvelado Amor
E da montanha desta vida fui Rei e Senhor

Marco Valente, Beja, 15/06/2013

Texto e foto: Marco Valente


[1] Maioral ou moiral – Cabeça ou chefe de diferentes grupos ganadeiros incumbidos das diversas espécies de gados. Chega ao século XX, deturpada pelos agentes da oralidade, onde podemos encontrar as designações de móral (pl. mórais) ou moiral (pl. moirais).
[2] Sornego – expressão do Baixo Alentejo, significando indivíduo com a pele escurecida pelas longas horas de exposição ao Sol.
[3] Peco ou pego – local mais fundo de um ribeiro, normalmente designado por peco ou pego escuro. Estão algumas lendas associadas a estes locais, da qual podemos destacar a seguinte, por envolver também um maioral de gado bovino: http://www.lendarium.org/narrative/o-pego-escuro/.
[4] Malhão – grosseiros muros de pedras secas encasteladas, voltados contra a direcção do vento dominante e sol escaldante. Geralmente erigidos em elementos pétreos do complexo xisto-grauváquico (ou de qualquer outro material mais abundante na área onde surgem), utilizando estevas ou qualquer outra cobertura arbustiva, ou não.

segunda-feira, 10 de junho de 2013

Nascimento

Iniciamos hoje este blogue, 1945 anos após a morte de Nero (Imperador romano), ocorrida em 68 d.C. e 341 anos após o nascimento de Pedro I, o Grande da Russia.
Como este Pedro – que empreendeu um périplo de 18 meses pela Europa, em que se fez passar por marinheiro e trabalhar como carpinteiro num estaleiro da Holanda, aprendeu a retalhar a gordura da baleia, estudou anatomia e cirurgia observando dissecação de cadáveres, visitou museus e galerias de arte – pretendemos, com base na nossa própria caminhada abarcar aqui uma série de temáticas, com uma visão Humanista. Partilhando conhecimentos e pensamento, a partir de uma experiência de décadas.
Durante todo este tempo fomos arqueólogo, investigador, funcionário de ourivesaria, guia de património, comunicador, técnico de arqueologia, professor estagiário, repositor, recenseador, agricultor aprendiz e feirante.
Ao longo deste percurso fomos apreendendo, recolhendo e publicando conhecimentos, que pretendemos agora partilhar através desta janela para o mundo.
Porque muito em nós foi investido e muito devemos às gerações que nos precederam, sem as quais não estaríamos hoje aqui.
Pretende ser um instrumento que permita compreender o presente da Humanidade, que no seu todo é, de facto, um pouco como o presente de cada Homem, fruto das experiências passadas, impregnado pelas ilusões, pelos entusiasmos, pelos erros, pelos sucessos e insucessos que cada um de nós viveu. De resto, não se explicaria o consumo tão amplo que hoje fazemos da História, se não fosse a curiosidade de descobrir aquilo que éramos, para melhor conhecermos aquilo que somos, e assim construir com bases sólidas o que poderemos vir a ser.
Um regresso ao passado, portanto. Mas que passado? Para quem o contemple distraidamente, ele apresenta-se como um amontoado caótico de episódios desconexos, um frenético agitar de personagens incompreensíveis, uma sequência de alianças, vitórias, derrotas, guerra e paz, que se repetem monotonamente ao longo dos séculos.
Existe, porém, uma outra maneira de ver o passado, o modo característico dos seres racionais que querem compreender a realidade, o processo da História, que investiga, organiza os seus materiais e deles extrai um sentido complexo.
Sejam todos bem-vindos, à viagem que agora iniciamos, navegando assim, por este imenso mar de ideias.


“O mar é tudo. Ele cobre sete décimos do globo terrestre. Seu sopro é puro e saudável. É um deserto imenso, onde o homem jamais está sozinho, pois sente a vida se movimentando por todos os lados.” – Julio Verne