Sr. Romão Mariano e Dona Luzia (foto: Maria João Marques) |
Um sujeito (Adriano Augusto Santos) veio de Trancoso e foi para Lisboa
aprender a arte de farmacêutico. Juntou uns dinheiros e casou-se com uma
senhora do Montijo.
Tiveram duas filhas que chegando à idade da adolescência quiseram
recolher-se e não conviver com outras raparigas da idade delas – ou qualquer
outra pessoa, salvo raras excepções[1].
Todos os dias recebiam jornais que compravam, mas não saiam de casa. Nunca
quiseram luz eléctrica.
Salvo erro em 1950 (ano santo mariano) a imagem de Fátima passou por
Pias e elas assomaram-se à varanda (mas recolhidas) para a ver. Uma das raras
ocasiões em que as “Santas”, como ficariam conhecidas na localidade, se deixaram
tenuemente vislumbrar.
Os moços mais novos por vezes, devido à curiosidade que tal episódio
neles suscitava (como à restante população da localidade em geral), por vezes
assomavam-se a este ou aquele muro para ver se avistavam alguma das “Santinhas”
no quintal.
A mãe delas tinha problemas de coluna (esteve cerca de sete anos
deitada, acamada) e o Dr. Abílio, médico, é que lhe prestava assistência em
termos de cuidados de saúde. Tentou arranjar casamento entre a filha mais nova,
a Maria de Lurdes Santos e este, ao que a filha lhe teria respondido: “A mãe
gosta tanto dele, case-se você com ele!”.
O seu esposo já tinha falecido, ela tinha receio de falecer, pois visto
que a irmã mais velha (Leonídia Santos) já indiciava que estaria a perder a
razão, não ficaria assim ninguém para tomar conta da irmã mais nova. Esta irmã
mais velha acabaria eventualmente por falecer após os pais de ambas, vítima de
cancro e sem nunca querer receber tratamento.
Um senhor, Manuel Málhinho é que tratava das coisas delas, após o
falecimento de seus pais. Ia às compras, tratava de todo o género de negócios
(tudo papéis passados por debaixo da porta do quintal).
Já por último, Maria de Lurdes Santos, a remanescente das duas “Santinhas”
ou “Santas de Pias” acabaria por ser levada contra a sua vontade para um Lar,
uma vez que vivia também sem o mínimo de condições de higiene. Só a título de
exemplo, espalhavam ambas jornais pelo chão da casa, onde tinham galinhas e
outros animais à solta. Quando o chão se encontrasse demasiadamente sujo
jogavam os jornais fora, substituindo-os por outros em camadas espalhadas pelo
chão.
O que é que nos
define enquanto seres humanos?
O que é que faz de
nós Humanistas ou não?
Onde começa e acaba a
responsabilidade social de cada um de nós?
Nunca me esqueço de umas palavras
escutadas há algum tempo atrás e na altura atribuídas a Mahatma Ghandi (se bem
que as palavras proferidas valham por si mesmas e não tão somente por quem as proferiu), fazendo assim também nós,
o nosso “mea culpa”:
“É muito fácil emocionarmo-nos por crianças com fome em África ou por
uma tragédia qualquer ocorrida na Índia mas, a maior parte das vezes não
prestamos atenção ao nosso vizinho que passa fome ou ao mendigo face a quem
viramos o rosto quando por ele passamos.”
Por isso, ousamos dizer: “Caridadezinha
jamais, Fraternidade sempre.”
[1] Daqui
nasceram uma série de rumores e estórias, motivados pelo insólito da situação.
Desde o pai que as teria feito reclusas na sua própria casa, por exemplo.
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