António Martinho da Conceição Duarte |
Testemunho de António Martinho da
Conceição Duarte, nascido a 23/12/1932 em Beja e residindo em Beja.
Esteve preso 6 meses e 3 dias.
Ocorreu este caso por altura das eleições do Humberto Delgado, em 1958, em
Beja.
Tinha ido assistir a um comício
na sede de candidatura do Arlindo Vicente – do MDPCDE, que depois desistiu em
favor do Humberto Delgado.
Ao passar pela Rua das Pedras um
polícia disse para o chefe: “ Aquele gajo que vai além tem vindo aqui todas as
noites!”
Depois chamaram-no, “Eu fui
fazendo que não os ouvia e chegava à Rua de Lisboa e eu piro-me. Ganhava as
mesmas ! Apareceram-me três pela frente, à entrada da mesma rua. Depois
prenderam-me e levaram-me para a esquadra no carro que costumava transportar o
governador civil.
Estive cá (Beja) preso 2 noites e
3 dias. Quando cheguei o Chefe Nobre perguntou-me quem era o outro que estava
comigo e eu disse que não sabia. Ao que ele retorquiu «Então esteve com o outro
e não sabia quem ele era ?»”
Em Beja não lhe bateram.
Como continuava a afirmar que não
o conhecia (ao outro que ia com ele) transferiram-no para Caxias. Cá em Beja
não lhe fizeram nada, talvez por consideração pela sua madrinha, uma das
mulheres mais ricas da cidade, Dona Antónia Costa Ribeiro Gomes.
Antes de ir para Caxias foi à Rua
António Maria Cardoso, à PIDE, onde lhe deram dois sopapos na cara.
Em Caxias[1]
matavam-nos nos interrogatórios, como ao Vítor Manuel Jesus Pires, com uma
lâmina. E depois iam abandonar os cadáveres nos pátios, sem autópsias nem nada,
para não serem contabilizados nas estatísticas.
“Com as mãos em concha batiam-me
nos dois ouvidos, ao mesmo tempo (deram-me cabo dos ouvidos e fiquei quase
surdo). Era pontapés, às mulheres queimavam-lhes os peitos e a um queimaram-lhe
os dois olhos com cigarros. Jogavam-me contra as paredes e se caísse no chão,
pisavam-me todo.
Ainda houve quem lá levasse mais
do que eu.
Sempre a perguntar quem era o
outro e há quanto tempo fazia parte do Partido Comunista.
Iam-nos buscar até às 3 da manhã
para sermos interrogados e tiravam-nos fotografias todos desgrenhados que
parecíamos uns assassinos!”
Quem não era formalmente acusado
passados seis meses tinha de ser solto e assim foi e quando saiu ainda lhe disseram: «Vai e não voltes mais, se não ficas com uma perna ao pescoço!».
“Nem davam dinheiro para a viagem nem nada. Fui ao
Hospital de S. José dar sangue para me darem algum dinheiro para o comboio,
para voltar para Beja.”
[1] Em
Caxias, para passar o tempo, os presos jogavam Dominó amassando a massa do pão
e com a tampa das caixas de fósforos (que serviam de forma) faziam as peças de
dominó e pintavam as pintas das peças com lápis.
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