Aproveitando o facto de se estar
a disputar mais um Mundial de Futebol, é nosso desejo fazer aqui uma homenagem
a quem ainda era do tempo do “jogar pelo Amor à camisola” – situação que ainda
é observável em muitas das colectividades de futebol amador que podemos
encontrar de Norte a Sul do País e ilhas.
Pertence à Associação de Futebol
de Beja e foi fundado em 1944.
Localiza-se na vila alentejana de
Pias, município de Serpa, distrito de Beja.
Da esquerda para a direita: Darvim Borges, Cardoso, José Lampreia |
Foi fundado também por três
amigos: José Lampreia (jogava a ponta direita), Cardoso (jogava a guarda-redes)
e Darvim Borges (jogava a avançado centro).
Iremos partilhar de seguida algumas
memórias de Darvim Rogado Borges, no que ao Piense diz respeito.
Desde os seus tempos de criança,
tais recordações ficaram para sempre marcadas na sua memória. Memórias
partilhadas por imensos meninos deste nosso País.
“Jogar os primeiros pontapés na
bola feita de meias, bexiga de porco e mais tarde de cabedal nas eiras do
Butelhão, Poço Caiado e no curral Montinho quartel general da rapaziada (…)”
(BORGES, 2000:2).
Alguns episódios ocorriam e
ficaram registados, como o que se relata seguidamente:
“(…) Como atrás citei, no curral
Montinho os rapazes da minha idade, entre os treze e os quinze anos,
improvisamos um campo de futebol, para que todas as tardes disputarmos os
nossos animados e rivais encontros, era um campo sem medidas de terreno muito
inclinado e tendo como linha lateral uma parede, com a qual jogávamos à tabela
de maneira a beneficiar dos ressaltos. António Caróca[1]
(homem feito), aparecia por ali a presenciar os nossos jogos e estudou o modo
de arranjar uns cobres para os seus copitos e cigarros.
Sempre que a bola rolava próximo
de si, corria a apanhá-la e só a entregava quando nós lhe déssemos quatro ou
cinco escudos (algum dinheiro na altura),
para satisfazer os seus vícios. Fez isto uma, duas e mais vezes, até que nós
também acabamos por estudar a maneira de contrariar as suas exigências, alguém
passou a ficar de alerta e quando o amigo António se aproximava recebíamos o
aviso, parando de imediato o jogo e entrando em intervalo forçado até que ele
se retirasse. A notícia da sua morte foi rapidamente conhecida por nós, quando
precisamente disputávamos um desses jogos, e assim fomos dos primeiros a chegar
junto do corpo já moribundo e ainda de corda no pescoço, pondo fim a esta
figura digna de um Bocage de aldeia.” (BORGES, 2000:7-8).
Apesar das rivalidades, três
clubes existentes na terra uniram-se por forma a fazerem um clube mais forte e
capaz de disputar outro género de provas. E tudo isto apesar da grande
rivalidade existente entre todos.
Seriam os três maiores clubes de
futebol nacional primodivisionários capazes de efectuar o mesmo?
Não nos parece, por uma série de
factores que extravasam a razão deste post.
“Houve em tempos aqui três grupos
de Futebol. Os Encarnados, os Unidos e os Fatalistas. Os Encarnados, aquele de
que eu fazia parte, foi criado por um grupo de rapazes tendo por mentores eu,
J. Lampreia, A. Rola, F. Cardoso, J. Ramires, Januário, Mário Caeiro, J. Braga,
Francisco Borralho e outros, tendo este último sido o financeiro do Clube, por
ser ele que fornecia o petróleo para a nossa iluminação, artigos que necessitássemos,
bem como o dinheiro para a compra dos equipamentos que possuíamos.
Havia uma grande rivalidade entre
os três Clubes. Grandes encontros no Baldio e Curral das Silvas. Como nenhum
era filiado na Associação e pouca projecção tinham para disputarem com terras
vizinhas.
Resolvemos nós os Encarnados
tendo connosco o Dr. José Manuel de Almeida, meu irmão Matias, Virgílio
Esperança e António Torres, dar outro nome ao Clube e indo buscar os melhores
dos Fatalistas e os melhores dos Unidos e fazermos o Piense Sporting Clube. O
nome é este porque a maioria era do Sporting e para satisfazer o gosto ao
grande obreiro do Piense e fervoroso Sportinguista Dr. José Manuel de Almeida.”
(BORGES, 2000:5-6).
“Não posso esquecer a figura do
grande homem que por aqui passou e tantas saudades deixou; Dr. José Manuel D’
Almeida. Esse homem foi o obreiro da passagem do Piense para as provas oficiais
ao ceder na sua Quinta terreno para ali ser feito o primeiro campo de futebol,
com medidas regulamentares, para a prática do mesmo, ao qual se deu o nome de
«Campo das Laranjeiras» o Clube foi filiado na Associação de Futebol de Beja e
começou a entrar em provas organizadas. Foi figura relevante que deixou obras e
saudade. Pias muito lhe deve.” (BORGES, 2000:9).
O Sr. José Campaniço, 79 anos,
foi jogador (ponta de lança) e começou a jogar em Pias. Numa determinada altura
recebeu dois convites para ir jogar: um era para Aljustrel e ofereciam trabalho
para ele a ganhar mais, o outro era para Moura e ofereciam trabalho para ele e
a esposa numa fábrica em Noudar. Decidiu-se a ir jogar para Aljustrel.
Sempre tinha estado habituado aos
trabalhos do campo, em Aljustrel colocaram-no a trabalhar numa mina. Habituado
aos trabalhos ao ar livre, no campo, o trabalho na mina era claustrofóbico, e
as mortes ou acidentes muitos.
Um dia, quando foram jogar a
Moura quis ir ver a esposa que estava grávida de uma menina e já nem foi ao
jogo, voltando ao Piense e aos trabalhos no campo.
Testemunho de seu neto, David
Teodoro, 34 anos, nascido em Pias, a viver em Moura e actualmente jogador do
Piense como o seu avô.
Bibliografia consultada:
[1]
Descrição de Darvim Borges, que melhor o conheceu: “António Caróca, homem de
fácil vida, desenrascado, descarado de divertido. Tanto brincou, tanto ameaçou
que se ia afogar ou enforcar, que acabou por morrer enforcado, numa das suas
simulações do costume.” (BORGES, 2000:7).
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