segunda-feira, 7 de julho de 2014

Piense Sporting Clube



Aproveitando o facto de se estar a disputar mais um Mundial de Futebol, é nosso desejo fazer aqui uma homenagem a quem ainda era do tempo do “jogar pelo Amor à camisola” – situação que ainda é observável em muitas das colectividades de futebol amador que podemos encontrar de Norte a Sul do País e ilhas.
Pertence à Associação de Futebol de Beja e foi fundado em 1944.
Localiza-se na vila alentejana de Pias, município de Serpa, distrito de Beja.
Da esquerda para a direita: Darvim Borges, Cardoso, José Lampreia

Foi fundado também por três amigos: José Lampreia (jogava a ponta direita), Cardoso (jogava a guarda-redes) e Darvim Borges (jogava a avançado centro).
Iremos partilhar de seguida algumas memórias de Darvim Rogado Borges, no que ao Piense diz respeito.

Desde os seus tempos de criança, tais recordações ficaram para sempre marcadas na sua memória. Memórias partilhadas por imensos meninos deste nosso País.

“Jogar os primeiros pontapés na bola feita de meias, bexiga de porco e mais tarde de cabedal nas eiras do Butelhão, Poço Caiado e no curral Montinho quartel general da rapaziada (…)” (BORGES, 2000:2).

Alguns episódios ocorriam e ficaram registados, como o que se relata seguidamente:

“(…) Como atrás citei, no curral Montinho os rapazes da minha idade, entre os treze e os quinze anos, improvisamos um campo de futebol, para que todas as tardes disputarmos os nossos animados e rivais encontros, era um campo sem medidas de terreno muito inclinado e tendo como linha lateral uma parede, com a qual jogávamos à tabela de maneira a beneficiar dos ressaltos. António Caróca[1] (homem feito), aparecia por ali a presenciar os nossos jogos e estudou o modo de arranjar uns cobres para os seus copitos e cigarros.
Sempre que a bola rolava próximo de si, corria a apanhá-la e só a entregava quando nós lhe déssemos quatro ou cinco escudos (algum dinheiro na altura), para satisfazer os seus vícios. Fez isto uma, duas e mais vezes, até que nós também acabamos por estudar a maneira de contrariar as suas exigências, alguém passou a ficar de alerta e quando o amigo António se aproximava recebíamos o aviso, parando de imediato o jogo e entrando em intervalo forçado até que ele se retirasse. A notícia da sua morte foi rapidamente conhecida por nós, quando precisamente disputávamos um desses jogos, e assim fomos dos primeiros a chegar junto do corpo já moribundo e ainda de corda no pescoço, pondo fim a esta figura digna de um Bocage de aldeia.” (BORGES, 2000:7-8).



Apesar das rivalidades, três clubes existentes na terra uniram-se por forma a fazerem um clube mais forte e capaz de disputar outro género de provas. E tudo isto apesar da grande rivalidade existente entre todos.
Seriam os três maiores clubes de futebol nacional primodivisionários capazes de efectuar o mesmo?
Não nos parece, por uma série de factores que extravasam a razão deste post.

“Houve em tempos aqui três grupos de Futebol. Os Encarnados, os Unidos e os Fatalistas. Os Encarnados, aquele de que eu fazia parte, foi criado por um grupo de rapazes tendo por mentores eu, J. Lampreia, A. Rola, F. Cardoso, J. Ramires, Januário, Mário Caeiro, J. Braga, Francisco Borralho e outros, tendo este último sido o financeiro do Clube, por ser ele que fornecia o petróleo para a nossa iluminação, artigos que necessitássemos, bem como o dinheiro para a compra dos equipamentos que possuíamos.
Havia uma grande rivalidade entre os três Clubes. Grandes encontros no Baldio e Curral das Silvas. Como nenhum era filiado na Associação e pouca projecção tinham para disputarem com terras vizinhas.
Resolvemos nós os Encarnados tendo connosco o Dr. José Manuel de Almeida, meu irmão Matias, Virgílio Esperança e António Torres, dar outro nome ao Clube e indo buscar os melhores dos Fatalistas e os melhores dos Unidos e fazermos o Piense Sporting Clube. O nome é este porque a maioria era do Sporting e para satisfazer o gosto ao grande obreiro do Piense e fervoroso Sportinguista Dr. José Manuel de Almeida.” (BORGES, 2000:5-6).

“Não posso esquecer a figura do grande homem que por aqui passou e tantas saudades deixou; Dr. José Manuel D’ Almeida. Esse homem foi o obreiro da passagem do Piense para as provas oficiais ao ceder na sua Quinta terreno para ali ser feito o primeiro campo de futebol, com medidas regulamentares, para a prática do mesmo, ao qual se deu o nome de «Campo das Laranjeiras» o Clube foi filiado na Associação de Futebol de Beja e começou a entrar em provas organizadas. Foi figura relevante que deixou obras e saudade. Pias muito lhe deve.” (BORGES, 2000:9).

O Sr. José Campaniço, 79 anos, foi jogador (ponta de lança) e começou a jogar em Pias. Numa determinada altura recebeu dois convites para ir jogar: um era para Aljustrel e ofereciam trabalho para ele a ganhar mais, o outro era para Moura e ofereciam trabalho para ele e a esposa numa fábrica em Noudar. Decidiu-se a ir jogar para Aljustrel.
Sempre tinha estado habituado aos trabalhos do campo, em Aljustrel colocaram-no a trabalhar numa mina. Habituado aos trabalhos ao ar livre, no campo, o trabalho na mina era claustrofóbico, e as mortes ou acidentes muitos.
Um dia, quando foram jogar a Moura quis ir ver a esposa que estava grávida de uma menina e já nem foi ao jogo, voltando ao Piense e aos trabalhos no campo.
Testemunho de seu neto, David Teodoro, 34 anos, nascido em Pias, a viver em Moura e actualmente jogador do Piense como o seu avô.



Bibliografia consultada:

BORGES, Darvim Rogado (2000): Recordando o Passado, (S/e) [Edição do Autor?], (S/l) [Pinhal Novo?]


[1] Descrição de Darvim Borges, que melhor o conheceu: “António Caróca, homem de fácil vida, desenrascado, descarado de divertido. Tanto brincou, tanto ameaçou que se ia afogar ou enforcar, que acabou por morrer enforcado, numa das suas simulações do costume.” (BORGES, 2000:7).

Sem comentários: