domingo, 30 de novembro de 2014

Alcunhas Madeirenses (II)

Uma professora que minha mãe teve no Arco de São Jorge (Santana, ilha da Madeira), nunca tratava os seus alunos pelo seu nome próprio.
Quando queria falar com algum deles ou chamar os mesmos para uma qualquer actividade, designava-os sempre por uma alcunha, tipo: "Maria da Fonte", "Tú que Fumas", "Caga nas Botas", etc...

Informante: Maria Isabel de Gouveia Valente, 71 anos, nascida no Arco de S. Jorge (Santana, ilha da Madeira) e a residir actualmente em Vila Nova de Gaia.

Nota: No século XVI, a população local desta freguesia era proveniente de Portugal Continental, nomeadamente do Minho e do Algarve. Teriam estes colonizadores levado consigo também esta forma de apelidar, diferenciando e tornando únicos, os indivíduos ?
Recordo-me que ao recolher nos livros das Imposições (salvo erro do século XVIII 1736 a 1738) - impostos pagos na alfândega do Porto sobre as pipas de vinho que entravam por via fluvial na cidade - para um trabalho efectuado para a Cadeira de História da Cidade do Porto (Curso de Licenciatura Pré-Bolonha em História - ramo Educacional) informes sobre esses impostos, colocava sempre nas observações informes acerca do nome do Barco, os Arrais, etc...
Verifiquei então, que muitos possuíam alcunhas, algumas já herdadas de família, tipo: "O Laranjo" e muitas outras. Para quem se interessar por esta temática, fica a sugestão de consulta. Esses mesmos registos, na década de 90 do século passado, estavam presentes na Casa do Infante, Arquivo Histórico Municipal.
Deixamos aqui estes pequenos apontamentos, para que o estudo geral nacional acerca destas problemáticas tenha assim mais este pequeno contributo.

domingo, 23 de novembro de 2014

Expressões da Linguagem Popular (VIII)

Antigamente, pelas décadas de 30 / 40 do século XX (assim como anteriores e posteriores) muitas pessoas que habitavam em localidades do interior de Portugal passavam toda uma vida sem ver sequer o mar. Atarefados na sua labuta diária, não tinham tempo para o ócio ou para si próprios sequer.
Esta expressão foi escutada a uma aldeã da Estrela, (aldeia pertencente à freguesia da Póvoa de S. Miguel, concelho de Moura) esposa de um moiral, num terreno alugado para a pastagem de gado.
Quem alugava aquele dito monte, naquele ano tinha de ser o "festeiro" da dita aldeia.
A expressão foi a seguinte:
"A menina não tem paixão de ir a banhos da ribêra?"
Num primeiro momento a informante não compreendeu o que a dita expressão queria dizer, até que a mãe lhe explicou, dizendo:
"A senhora quer saber se não tens pena (paixão) de não ir à praia (banhos da ribêra) [de Sines]."
Como a senhora nunca tinha ido à praia, a ver o mar, para ela ir à praia seria como ir tomar banho numa ribeira.

Informante: Professora Wanda Rodrigues e Rodrigues, recolhida em Castro Verde a 22/11/2014.

Episódios Caricatos (VI)

Antigamente costumavam-se fazer todo o género de pregões pelas ruas das aldeias e vilas (novidades, venda de terrenos, casamentos, falecimentos, etc...).
Quando em Moura faziam sessões de cinema ao ar livre, na década de 30 do século XX, a informante recorda-se de um episódio caricato.
O pregoeiro estava a percorrer as ruas da dita localidade, e dizia assim:
"No Sábado, vai haver cinema sonoro falado,
ao ar livre, destapado,
na esplanada do Sr. Dr. Bento Caeiro.
Com as «Pirulitas do Senhor Doutor!»"
(queria ter dito, "As pupilas do Senhor Reitor" - filme de 1935 de Leitão de Barros).

Informante: Professora Wanda Rodrigues e Rodrigues, recolhida em Castro Verde a 22/11/2014.

Festividades Cíclicas (I)

O Enterro do Bacalhau

[Memórias de eventos ocorridos em 1938, em Moura, durante a 4ª Feira de Cinzas.]

Haviam Cortejos que andavam pelas ruas (mais Homens do que Mulheres faziam parte dos mesmos), fazendo e dizendo versos de escárnio e maldizer.
Andavam pelas Tabernas, Esquinas e Ruas com um esquife, com o dito "Bacalhau" virtual.
Uma senhora que lhe tinha falecido recentemente o marido diziam uma rima que terminaria assim:
"À senhora fulana de tal fica um penico de ouro para meter as libras!"
A outro diziam o seguinte (mas sempre rimando, que agora não me recordo como era a dita rima na totalidade):
"Ao Dr. Bento Caeiro, deixamos um saco roto para ele meter o dinheiro!" - ele era dono de um colégio e tinha muitas obrigações em termos financeiros. Também os pais de alguns alunos só pagavam quando podiam: "Ali o dinheiro não coalhava!".

Informante: Professora Wanda Rodrigues e Rodrigues, recolhida em Castro Verde a 22/11/2014.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Quadras de WC (I)

Existem dias para tudo.
Da árvore, criança, mãe, pai, namorados, etc...
Também teria de existir este Dia Mundial do WC...
Porque 2,4 biliões de pessoas em todo o Mundo não possuem saneamento adequado e todos os anos 2,5 milhões de crianças morrem de diarreia, que poderia ter sido impedida se existissem boas condições de saneamento.
Um bom motivo para se celebrar este dia, o da luta para que tal situação se combata e todos tenham direito a um futuro melhor.

O WC sempre foi também local onde partilhávamos pensamentos mais brejeiros, libertadores mesmo (em todos os sentidos).
Daí o motivo deste post. O de através do Humor, também registar todos estes momentos.
Aqui segue o primeiro:

"Estava a sofrer de cagar
Vim aqui cagar à Caixa (Centro de Saúde)
Só por eu cagar por fora
Deram-me dez dias de baixa!"

[Gravado à mão na porta do WC do Centro de Saúde de Soares dos Reis, Vila Nova de Gaia]
Informante: António José Ferreira de Almeida Valente, 72 anos, natural de Castelões de Cepêda (Paredes), a residir atualmente em Vila Nova de Gaia.

Feliz Encontro n' "O Jardim de Epicuro".

A vida tem destes encontros. Descobri por intermédio de uma grande amiga que fiz agora recentemente um poeta cuja obra todos iremos conhecer em 18 publicações póstumas e próximas.
Um Homem a sério, que gostaria imenso de ter conhecido e privado pessoalmente.
Há pessoas assim. Que na sua companhia nos fazem esquecer as invejas, falsidades, parasitismos e pequenez intelectual dos muitos que nos rodeiam.
Só o conhecerei agora um pouco mais através da sua obra, mas do pouco que já pude observar, sinto que me esperam momentos de leitura apaixonantes, mui certamente.
Aqui fica a sua biografia, presente na obra: "O Jardim de Epicuro Cânticos Líricos".

António Baptista Borges

«António Baptista Borges nasceu em Évora, no dia 25 de Agosto de 1922.
O pai era oficial do exército e a mãe doméstica. O ambiente familiar - teve oito irmãos - era propício à afirmação da cultura, das raízes, da identidade, razão pela qual António afirmava enfática e frequentemente "O Alentejo é um Continente".
A mãe viu-o sempre carinhosamente como o primogénito, cedo se apercebendo do seu talento.
O acidente que lhe incapacitou um braço [ocorrido aos 7 anos de idade, em casa dos avós, em Pias] acentuou a sua cumplicidade relativamente às originalidades do seu carácter, estatuto que lhe valeu para sempre a alcunha de "Sr. Marquês".
Porém, a morte da mãe, quando António era jovem, desencadeou a desintegração da família.
Pretendendo seguir a carreira diplomática, licenciou-se em Económicas e Financeiras (Secção Diplomática e Consular), ambição travada pelo defeito físico num braço.
Foi o 1º classificado no Curso Superior de Cultura do Instituto Espanhol de Lisboa e diplomou-se em Estudos Americanos pela Universidade Hispano-Americana de Santa Maria de La Rábida (Huelva).
Por apreciar a cultura francesa, frequentou o Curso de Língua e Civilização Francesas, da Universidade de Aix-Marseille.
Identificava-se como "Cavaleiro Ibérico", valorizava o amor andaluz e Garcia Lorca.
No seu insaciável desejo de conhecimento - dominava as línguas italiana, inglesa, espanhola e francesa -, visitou o norte da Europa, a Escandinávia em especial, atraído pelo seu "blond" feminino.
A Itália e a Grécia não as conheceu como desejava, embora as tenha vivido febrilmente como a sua obra evidencia.
Mas foi a África, onde leccionou nas décadas de 60 e 70, que o marcou indelevelmente como atestam as suas memórias.
Foi professor do Ensino Secundário e Médio em Setúbal, Beira e Lourenço Marques (actual Maputo).
Faleceu, em Setúbal, no dia 1 de Dezembro de 2012.»

Um poema sempre actual:

"Proclamação

É preciso subir aos andaimes
E proclamar
O vazio da civilização;
Trepar pelos postos telefónicos
E cortar as comunicações;
Subir aos ministérios
E prender os políticos!
É preciso cortar as guitas
Dos balões de oxigénio
E deixar que as pessoas
Que são, de facto, boas
E incapazes de fazer mal,
Possam crescer
E viver
Sem tutela mental!
É preciso derrubar as mesas
Das reuniões
Onde se forja a infelicidade
E limpar as praias
Da ignomínia dos moralistas!
É preciso calafetar a fé,
Asfaltar a esperança
E dar livre trânsito ao amor!
É preciso que todos venham para a rua,
Assomem ao postigo e à janela,
Com um sorriso nos lábios
E uma flor na lapela!
E é preciso, é urgente
Caminhar depressa.
O mundo está cheio de gente
Que quer viver contente:
QUE NINGUÉM O IMPEÇA!"

In, Borges, António Baptista (2013): O Jardim de Epicuro Cânticos Líricos, Casa dos Professores de Setúbal - Centro de Estudos Bocageanos.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Expressões da Linguagem Popular (VII)

"Não queiras comparar o olho do cú com a Feira de Castro!"

A feira de Castro Verde é conhecida por ser um local onde se pode comprar e vender de tudo um pouco.
A expressão significa que não se pode comparar algo que nada vale com outra coisa que é o seu oposto e completamente grandioso.
Informante: César Augusto Castro Tereno Coutinho, 37 anos, nascido e criado em Moura.