quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (X)

Irmão do Amor - Amor proibido

Perdi-te sem nunca te ter tido
Vivemos em mundos diferentes
Tu vais para Norte quando eu sigo para Sul
Quando a teu lado passei a névoa encobriu-te

Estamos destinados a um caminho sem retorno
Longe do local em que irmãos fomos
O Sol desceu aos infernos mas eu não o vi
O meu destino é estar longe de ti

Ao longo dos campos destruídos
O teu coração batalhava
Tua memória não me abandonou
Neste baptismo de fogo que me auto-consumia

Digo adeus ao passado e a ti
Todos temos de morrer um dia
Mas estará para sempre escrito nas estrelas
Que tu serás a Luz que me alumia.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, sem data)


terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Pensamentos (II)

Entre os 3 e os 30 anos ajudei os meus pais a vender em feiras de Velharias, Antiguidades e Coleccionismo aos fins de semana.
Desde a Feira da Vandoma (realizada todos os Sábados, durando todo o dia, nas ruas em redor da vetusta Sé do Porto e algum tempo depois transferida para as Fontainhas), Feira da Praça de D. João I (decorrendo aos Domingos de manhã, no Porto), a "Feira dos Peludos" em Espinho (no primeiro Domingo de cada mês, durando também todo o dia), a Feira dos Golfinhos em Matosinhos, Feira das Velharias de Aveiro (realizando-se todos os 4º Domingos de cada mês - à excepção quando calhava em feriado, antecipando-se nesse caso para o Domingo anterior), Coimbra (todos os 4º Sábados de cada mês), Lisboa (a já velhinha Feira da Ladra e a Feira de Coleccionismo da Praça do Comércio - transferida depois para o Parque das Nações).
As memórias mantêm-se muito vivas.
O artesão que executava trabalhos refinados em madeira (adquiri-lhe um Anúbis e um quadro do FCP com um barco em alto relevo do qual saia a cabeça de um Dragão). Ao vendedor de cromos que eu ansiava encontrar para completar a Caderneta dos jogadores de futebol de uma certa temporada futebolística, ou do Sandokan - o Tigre de Mompracém, Star Wars e demais séries televisivas e filmes.
Os diálogos com os amigos e colegas feirantes,com clientes usuais ou meros curiosos, embalados em pano de fundo pelas cassetes de música "pimba".
Os vendedores de algodão doce e amendoins com mel.
A alegria da procura e o encontrar imensas preciosidades em lotes de moedas, selos, postais, notas, BD's, velhos alfarrábios, fotos de missões Apolo, guias de pagamentos de tropas liberais nos Açores, mapas e portulanos, Bulas de cruzada do século XVIII, uma miríade de riquezas tais, os sons, as cores, os cheiros e desamores.
Dava bem para um menino sentir que saía do seu pequeno espaço e embarcava nas maiores aventuras do Mundo que o rodeava.
Podia ser Arqueólogo a escavar uma qualquer ruína Chimú, companheiro de Viagem de Corto Maltese ou ainda o Ianes, amigo inseparável de Sandokan.
Num ápice estar lado a lado com um serviço de porcelanas chinesas, aqui um baú para restauro de um qualquer emigrado no Brasil no século XIX, ali um capacete de "bife" da Iª Guerra Mundial, com algumas condecorações a acompanhar o dito.
Tão depressa manuseava umas "Tangas" Timorenses, como uma carta de um soldado italiano preso num campo de concentração e com marcas da censura portuguesa e inglesa de 1917.
No meio destas "viagens" também sucediam alguns episódios caricatos.
Alguns deles também brejeiros. Passarei a contar um destes seguidamente.
Meus pais negociavam também com "Santinhos" - imagens de santos que pessoas coleccionavam especificamente e também faziam com estas "Registos" para uso próprio ou revenda.
Estes ditos "Registos" consistiam em pegar numa imagem de um Santo e/ou Beato específico e colocar num quadro com motivos vegetais e que teriam por fim último ser colocados num oratório, por exemplo.
Por vezes, lia algumas das dedicatórias, quadras, versos e orações que se podiam observar, geralmente num pequeno campo abaixo de cada iconografia específica.
Um dia, abaixo de uma imagem de uma Santa (não me recordo qual, especificamente) observei a seguinte quadra:

"Minha Mãe case-me cedo
Que me come a passarinha!
Oh filha, coça-a c'o dedo,
Que eu também coço na minha!"

Julgo que terá sido adquirida por alguém que nesta quadra não reparou, para efectuar um desses Registos. Um Registo malicioso, com um destino irónico deveras.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Poemas soltos (IV)

Terei medo... Temor?

Tenho medo do escuro e da noite
Do Desconhecido, do que há-de vir e da Morte
Busco saber do passado a sorte
De encontrar resposta que a ela se ajeite

Temo aquele que nos fez, pois não sei sua vontade
Sinto que já não sou o melhor dos seus filhos
Mas procuro levar à Sociedade
O sentir o bom que é pisar Seus trilhos

Haverá lugar para mim no coro dos Anjos?
Existirá ainda aqui o perfume da Pureza?
Desviado da rota p'la tentação e os desejos
Não sei que pensar... de nada tenho a certeza

Do Amor guardo comigo o conceito
Sei que com ele Deus caminha no meu peito.
Caminhará? Não o sei, pois tenho medo
E quanto mais ando mais nas Trevas me enredo.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, sem data)

domingo, 28 de dezembro de 2014

Rezas (IV) São Pedro (I) São Paulo (I) São João Evangelista (I)

Oração para rezar à noite. Visava afastar os maus espíritos.

Ôca, Marnôca
Três vezes Ôca
Pé no freio, freio na boca
Tista com Tista
Três vezes Tista
São Pedro, São Paulo, São João Evangelista
Da nossa casa assista.

Informante: António José Ferreira de Almeida Valente, 72 anos, nascido em Castelões de Cepêda (Paredes) e a viver em Vila Nova de Gaia.

terça-feira, 23 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (IX)

Preso ao desejo de ti...

Mente maldita que me tens cativo
Criatura patética! Como te tens iludido.
Da minha boca saem sílabas sem conexão
E nem tu nem ninguém as compreenderão

Quotidiano de um filme classe B
Onde actuo sem me interrogar porquê
Sou semente que pairo ao sabor do vento
Esperando nascer a qualquer momento

Prisioneiro do desejo carnal
Sem caminho que guie meus passos
Porque tudo o que desejo afinal
É o Amor que espero encontrar nos teus lábios

Nunca ninguém me viu chorar assim
Sem conseguir desta prisão sair
Procuro-te entre as sombras guiado por teu odor jasmim
Pensando em teu idioma corporal ao qual me quero unir.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, sem data)

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Poemas soltos (III)

Amigos desaparecidos

Ainda guardo comigo a vossa imagem
Na lembrança guardo bons e maus momentos
E nestas rimas presto singela homenagem
A todos quantos viveis em pensamentos

Nos vossos rostos ainda vejo a esperança
De todo aquele que deseja ser alguém
Todos mereceis esta lembrança
Que habita em mim, vossos amigos, vossa mãe

Vossos sorrisos, amizade, simpatia
Um ombro amigo para chorar, a empatia
A coragem com que viviam o dia a dia
Vossa amizade que jamais esmorecia

Estáveis presentes em todas as ocasiões
Nos casamentos, baptizados, comunhões
Mas mesmo nos momentos de ausência
Em espírito sentia essa presença

Aguardo pacientemente o futuro
Sabendo estar também só de passagem
Esperando em corações amigos
Deixar também impressa a minha imagem.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, 13/02/2001)

domingo, 21 de dezembro de 2014

Poemas soltos (II)

Valquíria vem buscar este soldado da Paz

De novo ontem ouvi uma notícia
Sabem? Mais uma criança morreu
Vem e vai um novo dia
E mais alguém o não viveu

Eu questiono: "E até quando?"
Continuaremos cegos e surdos
Mais um corpo está tombando
Uma voz mais para o coro dos mudos

Apenas mais uma nota de rodapé
Somente menos um boletim de voto
Menos um contribuinte, um explorado até
Na última página vem a sua foto

Um rosto que como tantos outros será esquecido
Até alguém viver a mesma história
E outros protagonistas assumam os papéis
De escravos da morte que todos somos, bem o sabeis

Mais um atentado aconteceu
Mas continuásteis impávidos e serenos
Mais um soldado da Paz que morreu
Afastai-o Valquíria, dos obscenos terrenos.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, sem data)

sábado, 20 de dezembro de 2014

Pensamentos (I)

"Há uma Luz que brilha a Oriente!"

Nesta época natalícia em que se celebra o nascimento do menino-deus, a mitologia parece acompanhar-nos por onde quer que vamos e nos locais mais improváveis.
De passagem fugaz por Selmes, entre acompanhamentos e reuniões, mais uma vez alguns pormenores diferentes retiveram a nossa atenção. Num estabelecimento comercial observamos ainda hoje testemunhos desse Sul Mediterrânico, tão bem descrito por Orlando Ribeiro e outros.
Numa parede, um painel de seis azulejos retratava uma cena de inspiração grega. Num navio a remos, três figuras femininas destacavam-se, depenicando cachos de uvas. Na popa, alguns elementos cerâmicos transportavam presumivelmente preciosos néctares dos Deuses. No fundo, à direita do observador uma cidade-estado de inspiração helénica, similar a visão idílica e romântica de Atenas e do seu Pártenon.






Ao falar com a proprietária, reparamos nas prateleiras por trás de si num pequeno busto enegrecido de Tut-ank-Hamon. A única resposta que esta senhora dava ao porquê da presença de tais representações fechava-se num breve: "Porque gostamos."













Por cima de um alto e esguio frigorífico, um touro. Qual altivo pai de Minotauro mirava todo este cenário em pose desafiante. Que conversas teriam os meros mortais que lá por baixo falavam, apontando para si e outras relíquias?






No balcão, outro cliente, qual Heródoto de barba hirsuta, ao saber que a minha profissão era a de  arqueólogo discorria teorias acerca da construção das pirâmides e demais monólitos. Partilhou connosco, naqueles breves instantes uma estória acerca da irmã que tinha falecido há pouco tempo atrás... tinha emigrado em busca de um futuro melhor.
A Grécia tinha sido então a sua segunda pátria - uma vez mais o Mediterrâneo se nos apresentava, representado agora em contornos de tragédia grega.
O nosso afã diário e profissional pôs termo a estes profícuos mas breves momentos de conversa e tive de me retirar, despedindo-me de ambos amavelmente e agradecendo as fotos que aqui apresento.
Liguei o carro e passei ainda pela entrada do estabelecimento. Recordando-me de uma recolha efectuada em 2010, abri o vidro da janela e perguntei com um sorriso:
"Então e o Diabo, ainda anda à solta aqui por Selmes?"
A resposta dada pelo velho Heródoto foi reveladora:
"O Diabo? O Diabo emigrou, já cá não vive!" - Diabo era uma alcunha de um natural de Selmes que teria ido para o Algarve... Aqui pelo Baixo Alentejo, pelos vistos até o "Diabo" emigra, em busca de algo melhor... Esperamos que os que por cá chegam, assim como os que aqui nascem e vivem consigam levar a sua luta diária a bom porto e a desertificação se torne mais uma estória de um tempo mau e distante, para escutar a um Heródoto do amanhã...
Que esse futuro risonho não esteja distante, para todo e cada um de nós.
Feliz Natal a todos vós que pela net navegais.

 Alguns artigos meus acerca de Selmes (Deriva do Árabe, pronunciando-se inicialmente saléme. Nome próprio de homem, que significará salvo, livre, isento):
VALENTE, Marco (2011) – Aldrabas e batentes de Selmes: um futuro inadiável ?, In Aldraba, Boletim da Aldraba – Associação do Espaço e Património Popular, n.º 10, Lisboa, pp. 4-6;

VALENTE, Marco (2010) – Andanças do Diabo por terras portuguesas. Algumas Lendas do Norte do país e do Baixo Alentejo, In Aldraba, Boletim da Aldraba – Associação do Espaço e Património Popular, n.º 9, Lisboa, pp. 9-12

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Poemas soltos (I)

Também publicarei aqui poemas soltos de minha autoria. Porque me desafiaram a partilhar todos eles. Alguns, pelo menos, irão sendo partilhados com todos vós. E sem mais delongas, aqui seguem.

Baile de máscaras

Just Use It - diz a marca
O que tu fazes muito bem
Usas e abusas como anarca
Não tens carinho por ninguém

És a figura mais perfeita
Vives para toda a facilidade
Ela até com o Diabo se deita
A ladra da alheia felicidade

O teu falso puritanismo
Que asco até mete nojo
Tiques parvos de elitismo
Com iscas andas no bojo

As máscaras (que tu coisa usas) com a maior perfeição
São a verdade e a pureza
Oh noiva do Zé aldrabão
Amiga da mentira e da torpeza

Não te preocupes ser boçal e asqueroso
Este mundo está para ti
Oh verme gosmento e baboso
O baile de máscaras é aqui.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, 01/07/2001)

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (VIII)

Só aqui vive quem não quer ver

Meu passo é inseguro e incerto
Nenhum som se escuta em meu redor
À minha frente se ergue a Céu aberto
A caverna que desce ao Mundo interior

Demando coisa mais augusta e preciosa
Perto dela o Graal parece mais ser parra
Sem uva, como flor (espinho sem Rosa)
Como acorde sem ter p'ra o tocar guitarra

Há muito que o senti pois sou diferente
Meu Deus Meu Deus, porque me abandonaste
Sozinho a afogar num Mar de gente
Que minha Dor infinda para ti baste

Não me encontro!!! Porquê?
Enganado fui e hoje vivo me enganando
Calando sou como quem não vê
A sociedade que ora vivo vomitando.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, sem data)

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (VII)

O beijo que me roubaste

Fecho os olhos conseguindo ver
Quão inocente foi o teu querer
Escuto o bater de meu coração
É impossível suster a emoção

Sem cara sem nome cor ou preconceito
És tão simplesmente sentimento
Sozinhos somos imperfeitos
Unidos transcendemos o momento

O beijo que tu me roubaste
Medo e incerteza desvaneceu
E quero que esse gesto baste
Para perpetuar o amor teu

De ti nunca me esquecerei
Com essa recordação viverei
E que para tal um só gesto baste
O do beijo que tu me roubaste

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, sem data) 

terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (VI)

Ratos de porão

Era uma vez um poderoso navio
Cheio de marinheiros fortes e experientes
Que guiados por um poderoso sábio
Foram em busca de terras distantes

Era bonito de ver tão forte gente
Enfrentando perigos e novos inimigos
Sempre sem medo de seguir em frente
E em cada porto fazendo 100 amigos

Nos seus corações o Amor era guia
E seu espírito indomável não esmorecia
Até que porém num belo dia
Algo acontece cessando a alegria

O sábio morreu, morreu o Amor
Nos seus corações entrou agora a dor
E daqueles lábios outrora contentes
Ouvem-se agora gritos estridentes

Por artes desconhecidas mágicas talvez
Esse barco é agora um navio maldito
Destruindo outros barcos uma após outra vez
Com força apocalíptica destrói o infinito

Pois se morre o Amor, esse sábio forte
Bravos marinheiros mudam sua sorte
E num mar social coberto de destruição
Passariam a ser meros ratos de porão

Como todas as histórias que são bem contadas
Esta nos dá também sua lição
É que vidas sem Amor são meros nadas
Libertemo-nos então da escravidão
Pois amar e ser amado é a solução

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, 10/02/2001)

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (V)

Somos conjuntos opostos

Quando eu digo azul tu dizes vermelho
Quero ir à Austrália, tu preferes o Alasca
Todos se interrogam qual o porquê
 - somos opostos toda a gente o vê

preferes os dias frios e chuvosos
os densos bosques de carvalhos frondosos
prefiro a praia e os dias quentes
a água do mar e as areias ardentes

gostas de canções e poemas melancólicos
de teus entes queridos tens sempre saudade
gosto de quentes danças e ritmos
de florescer e cativar nova amizade

tu vês aquilo que mais ninguém vê
eu sei aquilo que mais ninguém sabe
tu sentes que eu sinto o mesmo que tu
eu compreendo o que queres dizer

pois isto é claro como da noite para o dia
que tu me atrais e eu te atraio também
mais ninguém sabe o que sinto por ti
és tu o Sol e eu a Lua meu bem.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, 10/02/2001)

domingo, 14 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (IV)

Alma Gémea

Não disfarço ocultas intenções
Que em meu corpo nascem germinadas
Sem acomodar tais ilusões
Que rompem ao alvor das madrugadas

Pois cantando o encanto de teu corpo
Tua mente de sonho e ávidas quimeras
Tu me inebrias e infliges um sopro
Uma lufada de cândidas primaveras

Vivo ligado numa teia de ternura
Pois tu me dás carícias e poesia
E algo mais prezo para além da formosura
A divina luz que de tua alma irradia

Como vencido e rendido a teus encantos
A meu lado partilhaste a minha vida
Foste bálsamo para todos os meus prantos
Eterna companheira prometida

Seiva divina em terra conspurcada
Libertaste-me de minha escravidão
De uma vida incerta, morta, inanimada
Transformando o ódio em perdão.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, 19/02/2001)

sábado, 13 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (III)

No dia em que...

No dia em que os pássaros voltarem a cantar
Escreverei para ti mais um verso
Presente em mim estarás ao deitar e ao acordar
Meu viver será do presente o inverso

No dia em que a Lua brilhar no firmamento
Sem nuvens que escondam sua luz
Dentro de mim será mais forte o sentimento
Que da noite és a rainha que me seduz

No dia em que uma criança partilhe o seu sorriso
E que a memória da pureza renasça dentro de mim
Posso dizer que estarei no Paraíso
E para todo o sempre quererei viver assim

Nesse dia gritarão as próprias pedras
E os montes, esses gigantes adormecidos
Que o Homem que a Terra viu nascer
Está novamente no mundo dos vivos.

Marco Valente (El Mariachi, Vila Nova de Gaia, 30/01/2001)

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (II)

Promessa de Amor verdadeiro

Ainda me lembro
Das promessas que fizemos
Naquele mês de Abril
Promessas ? Uma, cem, mil !!!

Os sorrisos, os olhares que trocamos,
O início, em que ambos lutamos.
Mas a força que nos unia, era simples magia
Eu já amava e tu ainda apaixonada
Uma,,, nossa relação... que utopia

Trocávamos juras eternas de amor e fidelidade
Eu já fazia planos p'ra um futuro
Pois o presente toldava-me os sentidos
Não me importava com a idade

Mas um país velho e caduco
Onde fomos ambos nascer
Não quer o Amor, mas sim luto
Não vence, faz-nos perder.

Ainda não podes ser minha
Só quero, mas não posso ser teu
E o escárnio e maldizer o nosso Amor já perdeu.

As horas passam e os dias, vazios sem terminar
Guardam feridas e o tempo... nunca as irá apagar
Sei que não foi por ti, não me querias magoar
Sei que é fácil neste mundo desistirmos de lutar

Não sei porque o fizeste ou talvez não o consiga aceitar
Sim já sei que não me amas, sim eu continuo a te amar
Talvez uma secreta esperança, talvez... ainda me faça sonhar
Não queres que te ame Amor ?
Peço-te... deixa-me Amar.

Marco Valente (Vila Nova de Gaia, 15/11/2002)

quarta-feira, 10 de dezembro de 2014

Amores Platónicos (I)

Inicio aqui uma série de poemas escritos entre 2001 e 2002 (outros sem data mas da mesma década), versando acerca da temática de Amores Platónicos, pois nos últimos tempos tenho verificado que (para algumas pessoas) todo o Amor é efémero, pelo menos do seu ponto de vista e a traição e inversão de valores é o que conta.
Sob o pseudónimo de El Mariachi (personagem interpretada por Carlos Gallardo no filme de 1992 realizado por Robert Rodriguez), escrevi estes versos que sempre mantive como pessoais, até hoje.
Acho que o abandono, desprezo e traição a que fui votado ajudou a reviver todos estes tempos...
Será que não há mesmo Amor Eterno.... serei eu sempre um Great Gatsby que só encontra Daisys no seu caminho? Quem sabe.... um dia.... a Lua que pensava já ter encontrado e que era a meu ver Eterna, me apareça ao caminho e possa verdadeiramente ser feliz... Até lá.... Ficam estes Amores Platónicos.

Beleza perdida - e encontrada
(Quatro Estações)

Eras jovem e bela Primavera
Mil sorrisos nasciam em teu rosto
Flor mais bela que ao mundo a mãe dera
Flor de noiva em grinalda posto

O Verão em teu corpo esbelto
Em mim soltava ondas de paixão
E teus seios opulentos - meu prato predilecto
Sol de desejo e sensação

Com o Outono fria não ficaste
Árvore de verde despida
Enrugada mas jamais sem vida
Confirmavas o Amor que germinaste

Ao chegar o fim da caminhada
De andares pelo Céu e pelo Inferno
Em teu sorriso vislumbro minha amada
A Primavera que virá após o Inverno.

Marco Valente (El Mariachi - Vila Nova de Gaia, sem data)

terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Dedicado a todas as Mães verdadeiras deste Mundo (especialmente a minha)

O poema que seguidamente coloco online (não que seja um mestre da dialéctica ou da poesia) serve de homenagem aquela Mulher, aquela Mãe que sempre me Amou sem impor condições e verdadeiramente.
Porque Amar é aceitar o outro com seus defeitos e qualidades sem nunca o abandonar e porque infelizmente vivemos numa sociedade de burguesas e burgessas criaturas parasitárias, que nos roubam os sonhos.
Seres mimados, que nunca passaram fome nem sacrifícios e que ao primeiro desaire abandonam quem deveriam proteger e Amar.
Amo-te minha Mãe e sempre te amarei por toda a Eternidade.
Se hoje sou quem sou a ti o devo (a meu Pai também) e a mais ninguém.

Mãe
(Maria Isabel de Gouveia Valente - 10/06/1943 a 30/11/2014)

Quem foi aquela que quando me viu
pela primeira vez chorando nu e frio
logo me aconchegou, logo me sorriu
e em seu regaço com Amor me cobriu?

Quem foi aquela que quando eu corria
com um desvario, tropecei cai rompendo num pranto
logo a correr me veio valer
e me acalmou com um doce e suave canto
e sempre que eu caia logo me valia?

Quem foi aquela que me ensinou
a fazer letrinhas no meu caderninho.
Que sempre me viu como o seu pequenino
E sem nada em troca pedir, este ser Amou.

Quem foi aquela que nas dificuldades
Tudo suportou, passou necessidades
para que eu fosse Homem Bom e Justo
Com Valores, Princípios, com noção de tal custo?

Foste Tú minha Mãe Amada!!!
Mãe Querida, Doce e Adorada!!!
Ficou teu exemplo, ficou teu carinho
e p'ra sempre serei teu filho menino!

Autor: Marco Valente, Vila Nova de Gaia (escrita entre os dias 3 e 5 de Dezembro de 2014)

domingo, 30 de novembro de 2014

Alcunhas Madeirenses (II)

Uma professora que minha mãe teve no Arco de São Jorge (Santana, ilha da Madeira), nunca tratava os seus alunos pelo seu nome próprio.
Quando queria falar com algum deles ou chamar os mesmos para uma qualquer actividade, designava-os sempre por uma alcunha, tipo: "Maria da Fonte", "Tú que Fumas", "Caga nas Botas", etc...

Informante: Maria Isabel de Gouveia Valente, 71 anos, nascida no Arco de S. Jorge (Santana, ilha da Madeira) e a residir actualmente em Vila Nova de Gaia.

Nota: No século XVI, a população local desta freguesia era proveniente de Portugal Continental, nomeadamente do Minho e do Algarve. Teriam estes colonizadores levado consigo também esta forma de apelidar, diferenciando e tornando únicos, os indivíduos ?
Recordo-me que ao recolher nos livros das Imposições (salvo erro do século XVIII 1736 a 1738) - impostos pagos na alfândega do Porto sobre as pipas de vinho que entravam por via fluvial na cidade - para um trabalho efectuado para a Cadeira de História da Cidade do Porto (Curso de Licenciatura Pré-Bolonha em História - ramo Educacional) informes sobre esses impostos, colocava sempre nas observações informes acerca do nome do Barco, os Arrais, etc...
Verifiquei então, que muitos possuíam alcunhas, algumas já herdadas de família, tipo: "O Laranjo" e muitas outras. Para quem se interessar por esta temática, fica a sugestão de consulta. Esses mesmos registos, na década de 90 do século passado, estavam presentes na Casa do Infante, Arquivo Histórico Municipal.
Deixamos aqui estes pequenos apontamentos, para que o estudo geral nacional acerca destas problemáticas tenha assim mais este pequeno contributo.

domingo, 23 de novembro de 2014

Expressões da Linguagem Popular (VIII)

Antigamente, pelas décadas de 30 / 40 do século XX (assim como anteriores e posteriores) muitas pessoas que habitavam em localidades do interior de Portugal passavam toda uma vida sem ver sequer o mar. Atarefados na sua labuta diária, não tinham tempo para o ócio ou para si próprios sequer.
Esta expressão foi escutada a uma aldeã da Estrela, (aldeia pertencente à freguesia da Póvoa de S. Miguel, concelho de Moura) esposa de um moiral, num terreno alugado para a pastagem de gado.
Quem alugava aquele dito monte, naquele ano tinha de ser o "festeiro" da dita aldeia.
A expressão foi a seguinte:
"A menina não tem paixão de ir a banhos da ribêra?"
Num primeiro momento a informante não compreendeu o que a dita expressão queria dizer, até que a mãe lhe explicou, dizendo:
"A senhora quer saber se não tens pena (paixão) de não ir à praia (banhos da ribêra) [de Sines]."
Como a senhora nunca tinha ido à praia, a ver o mar, para ela ir à praia seria como ir tomar banho numa ribeira.

Informante: Professora Wanda Rodrigues e Rodrigues, recolhida em Castro Verde a 22/11/2014.

Episódios Caricatos (VI)

Antigamente costumavam-se fazer todo o género de pregões pelas ruas das aldeias e vilas (novidades, venda de terrenos, casamentos, falecimentos, etc...).
Quando em Moura faziam sessões de cinema ao ar livre, na década de 30 do século XX, a informante recorda-se de um episódio caricato.
O pregoeiro estava a percorrer as ruas da dita localidade, e dizia assim:
"No Sábado, vai haver cinema sonoro falado,
ao ar livre, destapado,
na esplanada do Sr. Dr. Bento Caeiro.
Com as «Pirulitas do Senhor Doutor!»"
(queria ter dito, "As pupilas do Senhor Reitor" - filme de 1935 de Leitão de Barros).

Informante: Professora Wanda Rodrigues e Rodrigues, recolhida em Castro Verde a 22/11/2014.

Festividades Cíclicas (I)

O Enterro do Bacalhau

[Memórias de eventos ocorridos em 1938, em Moura, durante a 4ª Feira de Cinzas.]

Haviam Cortejos que andavam pelas ruas (mais Homens do que Mulheres faziam parte dos mesmos), fazendo e dizendo versos de escárnio e maldizer.
Andavam pelas Tabernas, Esquinas e Ruas com um esquife, com o dito "Bacalhau" virtual.
Uma senhora que lhe tinha falecido recentemente o marido diziam uma rima que terminaria assim:
"À senhora fulana de tal fica um penico de ouro para meter as libras!"
A outro diziam o seguinte (mas sempre rimando, que agora não me recordo como era a dita rima na totalidade):
"Ao Dr. Bento Caeiro, deixamos um saco roto para ele meter o dinheiro!" - ele era dono de um colégio e tinha muitas obrigações em termos financeiros. Também os pais de alguns alunos só pagavam quando podiam: "Ali o dinheiro não coalhava!".

Informante: Professora Wanda Rodrigues e Rodrigues, recolhida em Castro Verde a 22/11/2014.

quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Quadras de WC (I)

Existem dias para tudo.
Da árvore, criança, mãe, pai, namorados, etc...
Também teria de existir este Dia Mundial do WC...
Porque 2,4 biliões de pessoas em todo o Mundo não possuem saneamento adequado e todos os anos 2,5 milhões de crianças morrem de diarreia, que poderia ter sido impedida se existissem boas condições de saneamento.
Um bom motivo para se celebrar este dia, o da luta para que tal situação se combata e todos tenham direito a um futuro melhor.

O WC sempre foi também local onde partilhávamos pensamentos mais brejeiros, libertadores mesmo (em todos os sentidos).
Daí o motivo deste post. O de através do Humor, também registar todos estes momentos.
Aqui segue o primeiro:

"Estava a sofrer de cagar
Vim aqui cagar à Caixa (Centro de Saúde)
Só por eu cagar por fora
Deram-me dez dias de baixa!"

[Gravado à mão na porta do WC do Centro de Saúde de Soares dos Reis, Vila Nova de Gaia]
Informante: António José Ferreira de Almeida Valente, 72 anos, natural de Castelões de Cepêda (Paredes), a residir atualmente em Vila Nova de Gaia.

Feliz Encontro n' "O Jardim de Epicuro".

A vida tem destes encontros. Descobri por intermédio de uma grande amiga que fiz agora recentemente um poeta cuja obra todos iremos conhecer em 18 publicações póstumas e próximas.
Um Homem a sério, que gostaria imenso de ter conhecido e privado pessoalmente.
Há pessoas assim. Que na sua companhia nos fazem esquecer as invejas, falsidades, parasitismos e pequenez intelectual dos muitos que nos rodeiam.
Só o conhecerei agora um pouco mais através da sua obra, mas do pouco que já pude observar, sinto que me esperam momentos de leitura apaixonantes, mui certamente.
Aqui fica a sua biografia, presente na obra: "O Jardim de Epicuro Cânticos Líricos".

António Baptista Borges

«António Baptista Borges nasceu em Évora, no dia 25 de Agosto de 1922.
O pai era oficial do exército e a mãe doméstica. O ambiente familiar - teve oito irmãos - era propício à afirmação da cultura, das raízes, da identidade, razão pela qual António afirmava enfática e frequentemente "O Alentejo é um Continente".
A mãe viu-o sempre carinhosamente como o primogénito, cedo se apercebendo do seu talento.
O acidente que lhe incapacitou um braço [ocorrido aos 7 anos de idade, em casa dos avós, em Pias] acentuou a sua cumplicidade relativamente às originalidades do seu carácter, estatuto que lhe valeu para sempre a alcunha de "Sr. Marquês".
Porém, a morte da mãe, quando António era jovem, desencadeou a desintegração da família.
Pretendendo seguir a carreira diplomática, licenciou-se em Económicas e Financeiras (Secção Diplomática e Consular), ambição travada pelo defeito físico num braço.
Foi o 1º classificado no Curso Superior de Cultura do Instituto Espanhol de Lisboa e diplomou-se em Estudos Americanos pela Universidade Hispano-Americana de Santa Maria de La Rábida (Huelva).
Por apreciar a cultura francesa, frequentou o Curso de Língua e Civilização Francesas, da Universidade de Aix-Marseille.
Identificava-se como "Cavaleiro Ibérico", valorizava o amor andaluz e Garcia Lorca.
No seu insaciável desejo de conhecimento - dominava as línguas italiana, inglesa, espanhola e francesa -, visitou o norte da Europa, a Escandinávia em especial, atraído pelo seu "blond" feminino.
A Itália e a Grécia não as conheceu como desejava, embora as tenha vivido febrilmente como a sua obra evidencia.
Mas foi a África, onde leccionou nas décadas de 60 e 70, que o marcou indelevelmente como atestam as suas memórias.
Foi professor do Ensino Secundário e Médio em Setúbal, Beira e Lourenço Marques (actual Maputo).
Faleceu, em Setúbal, no dia 1 de Dezembro de 2012.»

Um poema sempre actual:

"Proclamação

É preciso subir aos andaimes
E proclamar
O vazio da civilização;
Trepar pelos postos telefónicos
E cortar as comunicações;
Subir aos ministérios
E prender os políticos!
É preciso cortar as guitas
Dos balões de oxigénio
E deixar que as pessoas
Que são, de facto, boas
E incapazes de fazer mal,
Possam crescer
E viver
Sem tutela mental!
É preciso derrubar as mesas
Das reuniões
Onde se forja a infelicidade
E limpar as praias
Da ignomínia dos moralistas!
É preciso calafetar a fé,
Asfaltar a esperança
E dar livre trânsito ao amor!
É preciso que todos venham para a rua,
Assomem ao postigo e à janela,
Com um sorriso nos lábios
E uma flor na lapela!
E é preciso, é urgente
Caminhar depressa.
O mundo está cheio de gente
Que quer viver contente:
QUE NINGUÉM O IMPEÇA!"

In, Borges, António Baptista (2013): O Jardim de Epicuro Cânticos Líricos, Casa dos Professores de Setúbal - Centro de Estudos Bocageanos.

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Expressões da Linguagem Popular (VII)

"Não queiras comparar o olho do cú com a Feira de Castro!"

A feira de Castro Verde é conhecida por ser um local onde se pode comprar e vender de tudo um pouco.
A expressão significa que não se pode comparar algo que nada vale com outra coisa que é o seu oposto e completamente grandioso.
Informante: César Augusto Castro Tereno Coutinho, 37 anos, nascido e criado em Moura.

sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Alcunhas Alentejanas (XV) Quando o Alentejo e a Catalunha ficam tão perto….. já ali.

Quando o Alentejo e a Catalunha ficam tão perto….. já ali.

Procedendo a trabalhos de recolhas de alcunhas por terras de Pias (e demais elementos arqueológico/etnográficos), deparei-me com uma alcunha pouco comum, pensava eu, para esta terra, “Prim”.
Quem seria esta figura, ou este local (segundo testemunhos vindos de Moura, Prim teria sido um local).

Joan Prim i Prats, foi – no dizer de Antonio Ballesteros – “El hombre de Estado más hábil del siglo XIX”.
Nascido em Reus, a 16 de Dezembro de 1814, faleceu, assassinado em Madrid a 27 de Dezembro de 1870.
Foi um militar e político espanhol progressista muito influente no século XIX.
Deixo aqui o link para a Wikipédia (que com todos os erros que possa possuir ainda se vai revelando, de quando em vez, um ponto de partida inicial para muitas e profícuas pesquisas):


E outra publicação online, que mais fácil se torna em termos de consulta, para quem quiser saber mais acerca desta figura histórica:


Sabemos que o General Prim, fugido das tropas espanholas, entregou as armas, cavalos e arreios ao Administrador do Concelho de Barrancos, Manuel Cláudio Pulido, em 21 de Janeiro de 1866. Ainda hoje podemos observar no Museu Arqueológico e Etnográfico de Barrancos, a Espada do General Prim, da qual passamos a descrever, como podemos observar no dito Museu:

“Espada do General Prim
Período: Século XIX (1857)
Marca: Fª D: Toledo
Características: Espada espanhola, modelo de 1846 de tropa de cavalaria de linha. Lâmina de 86 [cm] com inscrição “Fª D: TOLEDO 1857”
Depósito temporário do Sr. Francisco Cândido Pulido”

Verificamos que em Pias [de acordo com informação presente na seguinte obra BORGES, Luís Figueira (1986): Monografia de Pias, Ed. do Autor, (s/l)] o General Prim teria pernoitado uma noite, com o seu séquito e que alguns deles poderiam ter ficado em Pias.
Teria nascido aqui e assim a dita alcunha? As pessoas mais idosas ainda se recordam de existirem em Pias dois irmãos de seus nomes, Domingos Prim Estrela e Manuel Prim Estrela, possuidores da alcunha que teria perpetuado assim a memória do dito General Prim e/ou seus seguidores liberais e progressistas.
Também por Moura, essa passagem de Prim pelo nosso País ainda estava bem viva na memória das pessoas mais idosas. André Lopes Infante Ferreira, 38 anos e a residir em Moura, afirmou-nos que em Moura, quando há uma grande confusão, as pessoas mais idosas, na casa dos 70 anos, costumam ainda hoje dizer: “Eh Pá ! Isto parece a Guerra do Prim!”. A pessoa a quem ele mais escutou dizer tal expressão era uma mulher natural de Brinches, mas a residir actualmente em Moura.
Assim, observamos ainda, que na memória popular, a figura deste militar e estadista catalão, ficou impressa nestes testemunhos, expressões e mesmo alcunhas.
Como teia de Ariadne, parecemos estar assim todos interligados em termos de Memórias, como a célebre “Teoria dos 6º”, e que não somos assim tão diferentes uns dos outros. Basta ir puxando o fio certo, que os novelos se vão assim fiando e tecendo vestimentas com as quais trajamos a nossa Memória colectiva.
Mais novidades em breve se seguirão, quanto a este Projecto e outros. Porque também Pias merece fazer parte das nossas memórias, sempre.

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Episódios Caricatos (V)

Numa aula de mecânica (para obter a carta de condução) em Setúbal, o Sr. Manuel Alcântara Caldeira, 70 anos, nascido e criado em Pias, ouviu contar o seu instrutor, o Sr. Guerra, esta estória caricata pela sua autenticidade nos aspectos factuais.
Estória que ilustra bem uma época. Ainda governava o Marcelo Caetano e certas coisas eram proibitivas, mas este Instrutor não teve medo de contar esta estória à rapaziada ali presente.

Guião para auxílio à visualização do vídeo anexo:

Sr. Manuel: “No Liceu, numa aula de História, o Professor perguntou a um aluno:
«Diga-me Augusto, qual foi o Português que ao longo de toda a sua vida lidou mais de perto com os Santos?»
(Parou por um bocadinho, né?)
O aluno pensou durante alguns instantes e por fim respondeu:
«Foi Henrique Galvão Senhor Professor.»
«Ora essa!» Admirou-se o Professor. «Então porquê?»
(Resposta do aluno):
«Porque nasceu em Santa Maria, dia de Santa Catarina, frequentou a escola de Santa Filomena, morava no Campo de Santa Ana, deu uma queda em Santa Bárbara e foi socorrido no Hospital de Santa Teresinha. Esteve internado na prisão do Hospital de Santa Maria, de onde fugiu no Dia de Todos os Santos.
Assaltou o Paquete Santa Maria ao qual lhe pôs o nome de Santa Liberdade. Passando pelas ilhas de Santa Lúcia, a caminho das Terras de Santa Cruz (Brasil). Fixando residência em São Paulo, na Rua de Santa Teresinha, donde viveu preso por causa de um Santo António (de Oliveira Salazar) que residia em São Bento e era natural de Santa Comba Dão!».

(Risadas)”

Recolha e video: Marco Valente

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Expressões da Linguagem Popular (VI)

"Quem não gostar que limpe o garfo!"

É como a questão do "Ovo de Colombo", pode-se fazer sim, mas primeiro é necessário pensar antes de o fazer.
E quem não gostar da maneira como foi feito, tivesse feito de outra forma.
"Quem não gostou, que tivesse gostado!"
Informante: Francisco José de Oliveira Domingos, 48 anos, nascido e criado em Serpa.

Expressões da Linguagem Popular (V)

"As migas se acabam e o pessoal deixa de comer!"

Eram as migas do João Lopes, em 1950. Estavam a fazer umas migas para o pessoal que estava a trabalhar e as ditas migas não chegavam para todos.
Daqui nasceu esta expressão.
Informante: Francisco José de Oliveira Domingos, 48 anos, nascido e criado em Serpa.

Expressões da Linguagem Popular (IV)

"Quando o petisco era fraquinho, a malta mais velha diz: «É fome e cabelo grande!»"
"Nos inícios dos anos 60 existiam os Hippies, que eram postos à margem e os mais velhos diziam que era uma geração perdida. Era fome, trabalho está quieto e era malta de cabelo grande."
Informante: César Augusto Castro Tereno Coutinho, 37 anos, nascido e criado em Moura.

Expressões da Linguagem Popular (III)

"Isto é uma casa farta ! Os ratos quando se assomam aos armários vêm com as lágrimas nos olhos!"

Significa que nessa casa a miséria é tal, que os próprios ratos, não encontrando o que comer, vêm a chorar dos armários.
Informante: César Augusto Tereno Coutinho, 37 anos, nascido e criado em Moura.

Alcunhas Alentejanas (XIV)


César "Smith"

César Augusto Castro Tereno Coutinho, 37 anos, nascido e criado em Moura.
A alcunha vem do tio, Joaquim Coutinho, falecido com 50 anos, nascido e criado em Moura.
Esta alcunha nasceu por causa de um jogador do Benfica e de um golo que ele marcou numa final.
O tio andou a correr pela escola a gritar: "Golo do Smith!" "Golo do Smith!". E assim ficou.
O seu irmão necessitava de uma alcunha por causa do atletismo e também ficou o "Chico Smith".

Alcunhas Alentejanas (XIII)

"Chico Sintra"

Francisco José de Oliveira Domingos, 48 anos, nascido e criado em Serpa.
Os seus irmãos também "herdaram" a dita alcunha.
Sintra é alcunha que vem do tempo do pai (tinha a alcunha no B.I., entre parêntesis).
O pai era mesmo natural de Sintra, de São João das Lampas, daí a alcunha.
De seu nome José Domingos, falecido aos 79 anos de idade em Beja.

sábado, 20 de setembro de 2014

Rezas (III) Bruxas (I)

Quando Dona Catarina e seu irmão passavam num certo local, no dito habitava uma velha corcunda, que as pessoas da localidade diziam ser bruxa.
Sempre que por ela passavam, faziam figas com os dedos da mão, dizendo esta oração já antiga:

"Tú és de ferro
E eu sou de aço
Tú és bruxa
Mas eu to embaraço
E o mal que me desejas
Vá para cima do teu engaço!"

Informante: Dona Catarina Conceição Maria Pedro, 76 anos, nascida no Espírito Santo (Mértola) e a residir actualmente em Beja. 

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Poetas Populares (II)

"Mulheres Alentejanas

Antigamente no Alentejo
o pão tinha outro sabor
Era do suor e cansaço
dum povo trabalhador

Em grupos pela madrugada
seguiam meio ensonadas
um rancho de ceifeiras
seguiam já meio cansadas

Antes do trabalho começar
há muito que madrugaram
deixaram as sopas já prontas
os filhos amamentaram.

Alguns pendurados nos seios
mamam com as mães a andar
os olhos semi cerrados
embalados pelo caminhar.

Quando chegam ao seu destino
à sombra das árvores os deitam
ajeitam as suas foices
os encarregados já espreitam.

Têm que se apressar
os regos são bem compridos
quando o sol está a pique
já têm os lombos doridos.

Com o vai-vém das foices
afinam suas cinturas
limpam o suor das testas
as suas carnes são duras

E, ao ritmo das foices
cantam canções em coro
assim enquanto se canta
não há tempo para choro.

Chega a hora tão esperada
para uma pausa fazer
é hora de merendar
mas pouco há que comer.

O pão está seco do calor
o toucinho a derreter
e para escorregar melhor
água fresca vai beber

muda os cueiros dos filhos
amamenta-os novamente
agora que ia descansar
são horas de pegar no batente

O Sol esse não perdoa
queima suas peles trigueiras
às vezes ficam a pensar
para quê tantas canseiras

Voltam para casa à tardinha
com os pés já arrastando
os cardos não perdoaram
algumas pernas rasgando.

Lavam-se apressadamente
ainda há muito a fazer
depois de lavarem os filhos
há que fazer o comer.

Têm que fazer a barrela
para a roupa branquear
depois varrem a casa
com os filhos a chorar

para fazer a açorda
põem a água ao lume
esmagam os alhos na tigela
como já é seu costume.

Cambaleando entra o marido
depois de já ter afogado
as suas mágoas na taberna
do vizinho ali do lado.

Se ele vier cantando
então está tudo bem
mas se ele vem resmungando
é melhor não falar ninguém

deita os miúdos à pressa
para não arreliarem o pai
às vezes se estala a porrada
já nem uma lágrima sai

depois de tudo acalmar
na cama caí esgotada
seu marido serve-se dela
mas ela não dá por nada.

Ainda se lembra a tempo
vai à pressa remendar
as calças do filho mais velho
porque esse anda a estudar

Têm gosto que ele saiba ler
para ter um outro ofício
Talvez um dia mais tarde
não tenha este sacrifício

depois de pouco dormir
levanta-se ainda cansada
volta a fazer o mesmo
porque já é madrugada

assim se passavam os dias
e os anos a correr
era sempre tudo igual
até se envelhecer.

Não usavam pó de arroz
nem pinturas no seu rosto
sua beleza natural
era marcada p'lo desgosto

Estas mulheres de trabalho
perfumadas com suor
envelheciam mais rápido
mas tinham grande valor.

Debaixo do tórrido Sol
desejava ver a labutar
aquele que diz que o Alentejano
é lento a trabalhar."

Poema da autoria de: Maria da Luz Filipe Duarte Freitas, 54 anos, nascida e criada em Beja.

domingo, 31 de agosto de 2014

Poetas Populares (I)

"Chocolate branco e preto embrulhado em prata vermelha

Uma menina de cor
andava na minha escola
Todos os dias a via
a chegar com a sacola

Parecia de chocolate
e devagarinho entrava
mas na hora do recreio
com ninguém ela brincava

Parecia envergonhada
Com os olhinhos no chão
Longe de nós se sentava
Não a via comer pão.

Rita era o seu nome
ouvi a professora chamar
mas a Rita não falava
com ninguém ia brincar.

Com um pauzinho escrevia
Na areia do jardim
e depois também chorava
nunca vi tristeza assim.

Um dia tomei coragem
ao seu lado me sentei
mas a Rita estremeceu
Será que a assustei?

Com a cabeça caída
Olhou para mim a medo
Eu desejava saber
qual seria o segredo.

Ofereci-lhe do meu lanche
Ela ficou a olhar.
Com os olhos tão abertos
Não queria acreditar.

Parti o meu pão ao meio
E ela então aceitou
Quando terminou de comer
para mim ela olhou.

E disse-me: Muito obrigada
E assim todos os dias
Eu com ela repartia
As minhas duas fatias.

Apesar de nada dizer
Sorria quando eu chegava
Fazia-me espaço no banco
E então eu me sentava.

Um dia disse a tremer
Que todos os dias, trazia
num saquinho de plástico
o lanche que a mãe fazia.

Mas ao chegar à escola
Uns meninos a esperavam
E por ela ser de cor
O seu lanche lhe tiravam.

Depois gozavam com ela
Por ela não ser branquinha
Não a queriam na escola
Por ela ser torradinha.

Eu também chorei com ela
E então desde esse dia
Quando ela vai p'ra escola
Eu faço-lhe companhia

Ela é muito meiguinha
Eu não posso compreender
Como é que haviam meninos
que lhe queriam bater.

A cor não é importante
Somos iguais, vê no espelho
Porque o sangue de nós duas
Esse também é vermelho!"

Poema da autoria de: Maria da Luz Filipe Duarte Freitas, 54 anos, nascida e criada em Beja (1)

Uma história que também comigo sucedeu e com um bom amigo que fiz na Faculdade de Letras da Universidade do Porto. Também aí reparei num rapaz cabo-verdiano, que se sentava nas aulas e ninguém com ele falava, o Emanuel (logo no início do ano lectivo 1995-1996) e decidi-me a ser o primeiro a ir com ele falar, pois racismo e xenofobia para mim sempre foi algo contra o qual lutei, luto e lutarei sempre.
Sei que muitas pessoas têm estórias semelhantes. A elas aqui as dedico, pois o bullying nas escolas não existe só por questões de cor e também na minha família mais chegada já se passaram/passam situações semelhantes.
Fica aqui o registo e o alerta, para que as pessoas se tornem mais Humanas/Humanistas, pois a ausência de valores e princípios nunca levou a lado nenhum, só ao fundo do poço.
E a Homenagem a todos aqueles que viram para além da cor, sexo, idade e religião e identificaram-se com outro ser humano, nascendo daí grandes, valiosas e valorosas relações de amizade e familiares também.

(1) Iremos colocando de hoje em diante Poemas, estórias e contos da autoria desta valorosa Mulher e Poeta Popular Alentejana. Para que fiquem registados e possam ser também contados às gerações futuras, Homens, Mulheres e Crianças.

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

Episódios Caricatos (IV)

Esta "estória" era contada pelo meu avô, o Sr. José Lourenço de Gouveia, como uma anedota, mas que se teria passado na realidade no passado - isto de acordo com quem também a teria ouvido contar.

Uma mãe tinha três filhas, muito belas e formosas, mas eram todas as três "tatibitates".
Por vergonha, esta escondia todas as três dos olhares do povo e nasciam estórias várias acerca do porquê de ocorrer  tal situação.
Um dia, a mãe teve de sair para ir buscar haveres para casa, mas antes de o fazer, recomendou assim às suas filhas:

"Filhas, a vossa mãe tem de ir à venda buscar pão, arroz e outros mantimentos.
Não abram a porta a ninguém, pois há pessoas que nos querem mal lá fora.
Mas acima de tudo, não falem nada com ninguém!"

E, recomendações dadas, saiu porta fora.
Um belo rapaz novo, passando à porta das três irmãs, e desconhecendo que as mesmas aí habitavam (segundo uns) ou querendo ver mais de perto as três formosas adolescentes (segundo outros), bateu à porta e pediu para beber água.
As irmãs tinham receio de abrir a porta e faltar assim ao recomendado por sua mãe, mas a beleza e juventude do moço venceu-lhes os seus medos.
Abriram a porta, deixaram-no entrar e foram buscar um copo de água.
Sempre em silêncio.
Nisto, a irmã que estava a dar o copo de água ao rapaz, deixou-o cair e este partiu-se.
Diz uma delas:

"Tá tubado, tá tubado !" (Está quebrado, está quebrado!)

Diz a segunda:

"A mãe não dizia que não se fanasse!" (A mãe não dizia que não se falasse!)

Responde a última das três:

"Bem fiz eu que não fanei!" (Bem fiz eu que não falei!)

E o rapaz saiu da casa às gargalhadas, ficando as três envergonhadas e sabendo-se assim no povo que eram todas as três "tatibitates".

Informante: José Lourenço de Gouveia (já falecido), nascido e criado no Arco de S. Jorge, Santana, Ilha da Madeira.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Episódios Caricatos (III)

Quando trabalhou nas Minas de Aljustrel, ou melhor dizendo ia prestar serviço às Minas, o Sr. Paulo Avoila Brincheiro, recorda-se que nas várias entradas de galerias existiam imagens de "Santas", iluminadas lateralmente por duas lampadas.
Existiam pessoas mais religiosas que se benziam e rezavam frente às imagens, por devoção e buscando protecção, antes de entrarem nas ditas galerias da mina.
Um dia, fundiu-se a lâmpada de um dos lados da "Santa" e passado algum tempo fundiu-se a outra.
Por brincadeira, o Senhor Paulo disse para um electricista que lá estava por perto:
"Enquanto a Santinha estiver às escuras, eu não entro na mina."
O que é um facto é que quando lá voltou novamente a prestar serviço, a "Santinha" já se encontrava totalmente iluminada.
A religiosidade é motivadora em múltiplos aspectos e esta estória bem o elucida.

Informante:  Paulo José Avoila Brincheiro, 43 anos, nascido e criado em Pias (Serpa).

sábado, 16 de agosto de 2014

Alcunhas Madeirenses (I)

"Feiticeiro"

O pai do padre da Paróquia do Arco de S. Jorge (o Moisés), tinha sete irmãos.
As pessoas diziam que ele seria "Feiticeiro", porque adivinhava as coisas.

Informante: Maria Isabel de Gouveia Valente, 71 anos, nascida no Arco de S. Jorge (Madeira) e a residir actualmente em Vila Nova de Gaia.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Episódios Caricatos (II)



·         O meu pai (José Lourenço de Gouveia, falecido aos 83 anos), uma vez estava na “Venda” (Taberna e Mercearia), no Arco de S. Jorge e depois o Sr. Ricardo Menezes (dono da venda) disse assim:
- “Tenho que ir buscar o carro (camião com mercadoria) ao Funchal e depois venho cansado.”
Meu pai ia ao Funchal nesse dia buscar compras.
E então meu pai disse assim:
- “Buscar o carro ao Funchal! Eu vou até ao Funchal e trago o seu carro sem bater em lado nenhum!”
Meu pai não tinha carta de condução.
O Sr. Ricardo disse então:
- “Eu quero ver isso.”
Apostaram entre os dois 1 kg de carne, 5 litros de vinho, pão e uma espetada de carne de vaca.
Depois meu pai chegou no outro dia de manhã à casa do Sr. Ricardo e ele disse assim:
- “Então Sr. José ? Já foi buscar o carro ?”
- “Já!”
- “Então, onde é que está?”
Meu pai meteu a mão no bolso e disse:
- Está aqui!
E tirou um carro de linha (de costura) do bolso.
E o outro disse:
- “Oh Sr. José! Agora é que me lixou!”
E pagou-lhe o acordado previamente.

Informante:  Maria Isabel de Gouveia Valente, 71 anos, nascida no Arco de S. Jorge (Madeira) e a residir actualmente em Vila Nova de Gaia