terça-feira, 20 de maio de 2014

Alcunhas Alentejanas (IX)

Um esclarecimento quanto a esta temática se impõe. Respeitamos sempre a vontade dos informantes que queiram permanecer anónimos, ou sem fotografia a ilustrar a Alcunha em si, tendo em consideração que é uma “recolha difícil e delicada. Na verdade, identificar o «outro» com um nome falso, que é maioritariamente rejeitado, é tarefa delicada.”(RAMOS, 2003:6).
De igual modo temos verificado que – tal como era expectável – apenas os que possuem alcunhas aceitáveis, digamos, tais como “Borreguinho” ou “Penca”, mais facilmente «dão a cara» à fotografia[1], do que aqueles que possuem alcunhas jocosas ou consideradas pelos mesmos como aviltantes, tais como “Cagalhão” ou “Merda Crua”.
Também, por sabermos que “(…)o levantamento exaustivo das alcunhas do Alentejo ainda não está feito; para isso seria necessário um investimento significativo em recursos humanos e financeiros e em tempo.” (IDEM: 5) pretendemos assim prestar este modesto contributo também face a tais propósitos.
Sem mais considerandos, passamos à estampa um poema de Mestre Romão Moita Mariano (Poeta e Ferreiro de Pias – Serpa), dedicado às ditas Alcunhas Alentejanas. Registo de uma brincadeira feita para registar quando um indivíduo de Pias “O Choco”, ao efectuar melhorias à sua habitação, ter chamado para ajudar na dita obra, inadvertidamente, os “Cagas” (sem ofensa), seus conterrâneos.

ALCUNHAS DA NOSSA TERRA

O «Chôco» junta uns patacos
P’ra melhorar a casinha
Queria por nos quartos tacos
E tijoleira nos tectos
Se já não fosse p’ra ele
Era para os filhos ou netos

Para ver realizado
Aquele sonho tão belo
Um pedreiro foi contratado
Um vizinho ali ao lado
O Mestre «Caga Amarelo»

Quando a obra começou
Precisavam de um servente
O «Chôco» não hesitou
Pensou logo num parente
E logo sem mais desvendos
Foi ao Outeiro desmandado
E trouxe o «Caga Remendos»
Que estava desempregado.

Na construção da placa
A coisa ficou bicuda
A equipa era fraca
Precisavam de outra ajuda
O «Chôco» ouviu o recado
E abalou sem mais palavras
E foi buscar o cunhado
Que já estava reformado
O Tio Joaquim «Caga Favas»

Quando a placa ia a meio
O pocinho foi-se abaixo,
E o «Chôco» cheio de mágoa
Vendo o poço na sequeira
Mandou o Chico Cubaixo
À do Senhor Zé Madeira
P’ra mandar um bidom d’agua

Pediu pressa muita pressa
E o pedido foi aceite
Pois dai por um bocado
Dando volta na travessa
Com o bidom atisbado
Vinha o Luiz «Caga Azeite»

(tudo isto é real: Aconteceu quando o Chôco fez a reparação da sua casa em 1985).

Bibliografia consultada:
RAMOS, Francisco Martins; SILVA, Carlos Alberto da (2003): Tratado das Alcunhas Alentejanas, Edições Colibri


[1] Este registo fotográfico, voltamos a afirmar, com a autorização dos visados pelas alcunhas respectivas, é assim uma forma de manifestar a aceitação das ditas como uma brincadeira, sem maldade e com à vontade. Também cumpre o propósito de demonstrar quantitativamente quais as alcunhas mais facilmente aceites pelos próprios.

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