Marco da Comenda de S. Clemente (Moita Redonda)[1]
Durante trabalhos que executamos
entre Outubro de 2007 e Maio de 2008, pela serra do Caldeirão fomos registando
e investigando variadíssimos elementos patrimoniais.
Destes, também um marco
territorial mereceu a nossa atenção.
Aspecto do Levantamento do Marco (presumivelmente ainda in situ) |
Tratava-se de um marco de
delimitação territorial em calcário. Muito possivelmente do Século XVII.
A transcrição é a que segue, uma
vez que se assemelha à de um outro marco que Abel Viana e Mário Lyster Franco
estudaram e que tinha sido achado em espaços geográficos próximos.
Com pequena espada –
presumivelmente da Ordem de S. Tiago ou Espatários – que encima a seguinte
inscrição:
:COM:DE / SCLEM
Levantamento Marco Comenda de S. Clemente |
Que Abel Viana e Mário Lyster
Franco transcreveram como COMENDA DE SÃO CLEMENTE, e dataram como sendo do
século XVII, mas de proveniência desconhecida. Este marco possivelmente ainda
se encontrará in situ, uma vez que se
situa também em zona de fronteira entre S. Barnabé e Loulé (existe um marco
contemporâneo em betão a cerca de um metro, de divisão territorial entre
Almodôvar/S. Barnabé e Loulé).
Uma leitura atenta de várias
fontes levou-nos a concluir o seguinte:
Marco da Colecção Rosa Madeira - Museu Arqueológico Faro |
·
a existência de pelo menos um outro marco
exactamente idêntico, recolhido por um indivíduo do Ameixial (Sr. Rosa Madeira –
presentemente com o n.º 00091 de inventário relativo à colecção deste indivíduo
no Museu Arqueológico e Lapidar Infante D. Henrique de Faro), de proveniência
desconhecida, mas que muito certamente
viria de uma qualquer localidade ou monte situado nas cercanias e
comprovará que existia uma delimitação deliberada e efectiva dos terrenos da
dita comenda;
·
apesar dos solos neste local serem relativamente
pobres, os locais de implantação e demarcação desta “Comenda de São Clemente”
são-nos desconhecidos e poderiam englobar solos aráveis e perfeitamente
cobiçáveis situados mais a Sul;[2]
·
o facto de ter representada a Espada da Ordem de
Santiago, faz-nos pensar que fosse um terreno da qual a dita fosse possuidora,
uma vez que neste espaço geográfico a sua influência foi imensa.
Este marco, para além disso,
também é simbólico da divisão geológica dos terrenos da orla terciária e
quaternária do Barrocal e do litoral, em contraste com o maciço antigo, os
ásperos e ondulados xistos serranos. Muito possivelmente, se forem realizadas
prospecções sistemáticas nestes e entre estes locais, outros marcos poderão
surgir, quiçá ainda in situ.
Gostariamos de expressar o nosso
agradecimento sincero à Dra. Marta Valente (Geóloga e Ilustradora), pelas
informações quanto à descrição geológica de diversos locais e pelo tratamento
informático em gabinete do levantamento efectuado pela nossa pessoa no local.
Também gostaríamos de aproveitar
para agradecer a disponibilidade e amabilidade do Dr. Nuno Beja (Museu
Arqueológico e Lapidar Infante D. Henrique, Faro), dos funcionários do Arquivo
Histórico Municipal de Loulé, Bibliotecas de Almodôvar e Beja. Ao Dr. Rui
Cortes também fica aqui a nossa palavra de agradecimento.
Bibliografia consultada:
·
ENCARNAÇÃO,
Pedro Henrique Ferreira (1993): As visitações da Ordem de Sant’iago às
igrejas do concelho de Loulé no ano de 1534, Delegação Regional do Algarve
da Secretaria de Estado da Cultura, Faro;
·
GUERREIRO,
Rui Manuel Gaspar Cortes (1999): Levantamento da Carta Arqueológica de
Almodôvar Relatório de Estágio Profissional, II vols., C.M.A., C.E.F.P.O.;
·
LAMEIRA,
Francisco I.C.; SANTOS, Maria Helena
Rodrigues dos (1988): Visitação de igrejas algarvias da Ordem de S. Tiago de
1554, A.D.E.I.P.A., Faro;
·
LEAL,
Bruno (2004): La Crosse et le Bâton. Visites pastorales et recherche des
pécheurs publics dans la diocèse d’Algarve 1630-1750, Centre Culturel
Calouste Gulbenkian, Paris;
·
MAGALHÃES,
Joaquim Romero (1993): O Algarve Económico 1600-1773, Editorial Estampa,
Colecção Histórias de Portugal, n.º3;
·
MARTINS,
Luísa Fernanda Guerreiro (2004): Memórias Paroquiais do Concelho de Loulé,
In Al-uliã, Revista do Arquivo
Histórico Municipal de Loulé, n.º 10, Loulé, pp. 387-435;
·
SERRA,
Manuel Pedro (Coord.) (1996): Visitação da Ordem de Santiago ao Algarve
1517-1518, Suplemento da Revista Al-uliã, n.º 5, Arquivo Histórico
Municipal de Loulé, Loulé;
·
VIANA,
Abel; FRANCO, Mário Lyster (1945): O
espólio arqueológico de José Rosa Madeira, Separata da Revista Brotéria,
vol. XLI, Lisboa
[1]
A informação acerca deste elemento pétreo e local em si – para além da presente
em VIANA, Abel; FRANCO, Mário Lyster (1945): O espólio arqueológico de José
Rosa Madeira, Separata da revista Brotéria, vol. XLI, Lisboa e na
ficha de sítio n.º 74 em GUERREIRO,
Rui Manuel Gaspar Cortes (1999): Levantamento da Carta Arqueológica de
Almodôvar Relatório de Estágio Profissional, vol. II, C.M.A. C.E.F.P.O. –
foi dada inicialmente por um cidadão de origem francesa [que nós, para
protecção da dita pessoa optamos por não mencionar aqui neste post]. Disse-nos que tinha visto há algum
tempo atrás uma pedra com um tipo de espada gravada. Poderia ser uma estela de
qualquer tipo (como arqueólogo e associativista julgamos ser nosso dever
averiguar sempre estes informes, uma vez que o trabalho de arqueólogo não
começa em campo e não termina em gabinete, mesmo que alguns deles se revelem
posteriormente como uma mera “caça aos gambuzinos”).
[2]
“Em 1629 a Câmara de Loulé recebe ordem régia para tombar as propriedades do
concelho, o que se torna difícil por pegarem com as de gente poderosa – os Barretos
e os Furtados de Mendonça. Demarcação controversa fez-se, em 1624, com o
Morgado de Quarteira; com o comendador Lopo Furtado de Mendonça só em 1639.” In MAGALHÃES,
Joaquim Romero (1993): O Algarve Económico 1600-1773, Editorial Estampa,
Colecção Histórias de Portugal, n.º 3, p.150. Mas, não é somente com membros da
aristocracia que o município de Loulé dirime os seus conflitos, com o clero,
possuidor de terrenos, as questiúnculas também eram inevitáveis. “A partir de
1705 começam os conflitos da Câmara de Loulé com os padres gracianos, grilos e
capuchos por causa dos gados que estes privilegiados metiam nos limites da
vila.” Idem, p. 171.
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